terça-feira, 22 de dezembro de 2009

BOAS FÉRIAS!

Caríssimo leitor,

Obrigado pela companhia durante esse semestre.

Desejo-lhe um ótimo final de ano e um excelente período de férias!

Até a volta,

Giordano.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

ENTREVISTA COM LUCIA MASSARA


Lucia Massara é professora de Direito Civil na UFMG e na Faculdade de Direito Milton Campos, e advogada especializada em Família e Sucessões. Entre 1978 e 1994, foi Procuradora-Geral da UFMG. Dirige, há 10 anos, a Faculdade de Direito Milton Campos. No dia 6 de outubro de 2009, concedeu-nos a entrevista a seguir transcrita, em cuja realização colaboraram Santiago Pinto e Luiza Amaral.


“Ser professor é compartilhar com os estudantes a sua esperança, a sua desesperança, o seu conhecimento, a sua necessidade de aprendizado, a sua vida, o seu sonho”.


1. Professora, de onde vem o apelido Lucia Massacre? O povo quer saber...

Uma feliz coincidência. Quando fiz concurso nesta Faculdade, o resultado saiu no dia 20 de maio, e a minha contratação só em julho, mas ao chegar em casa, no dia 20, havia uma pilha com 180 trabalhos de casamento putativo, para corrigir. O professor Wilson Mello da Silva havia indicado este trabalho para o quinto ano – era o titular da disciplina Família e Sucessões. E como eu encontrei os trabalhos com aquela repetição de parágrafos e de exposição, eu dei notas apenas considerativas, tipo 1 em 20, e estou esperando até hoje que se apresente o autor do copião, para que seja a ele atribuída a nota cabível. Continuo esperando. Isso foi um fator até então desconhecido nesta Casa: a nota baixa para um número muito grande de estudantes.

E o apelido dura desde então...

Sim. É, para mim, um apelido muito carinhoso, por isso o conservo. Continuo exigente. Eu pratico o lema do Che Guevara: é preciso endurecer, sem perder a ternura.

2. Como a senhora se decidiu pelo magistério?

Eu sofri uma influência bastante forte de dois professores que conheci no período inicial da minha vida de estudante belorizontino. Um foi o professor João Milton Henrique, que foi meu professor de Prática Jurídica no curso de contabilidade que fiz no IMACO. E outro foi o professor Wilson Mello da Silva, que foi meu professor de Direito Civil no segundo ano desta Faculdade.

Professor Wilson Melo fez uma coisa própria de educador. Nós havíamos malandrado muito no primeiro ano, estudando a Parte Geral. Quando ele foi designado para dar para nós o Direito das Obrigações, começou a se dedicar aos elementos da obrigação e percebeu que nós estávamos perfeitamente inadaptados em pessoas, bens, ato e fato jurídico. Ele fechou o programa de Obrigações e usou o primeiro semestre do segundo ano para nos dar a Parte Geral e o segundo semestre do segundo ano para nos dar o Direito das Obrigações. Considerei esta atitude como caracterizadora de uma responsabilidade profissional muito grande. Serviu-me como uma grande lição. E a esse tempo eu já era funcionária da Prefeitura, e trabalhava no serviço jurídico, no qual já trabalhavam estes dois professores: o João Milton e o Wilson Melo.

O meu trânsito com eles me ajudou muito no conhecimento da figura do professor, da tarefa do professor, da função do professor, e da alegria que eles sentiam em ministrar aulas. E acho que não errei.

3. E o que é ser professor?

Ser professor é compartilhar com os estudantes a sua esperança, a sua desesperança, o seu conhecimento, a sua necessidade de aprendizado, a sua vida, o seu sonho. A vida e o sonho mesmo. É construir juntos uma perspectiva de vida nova, para eles e para nós.

4. Que habilidades a senhora considera importantes para quem participa da administração escolar?

Antes de mais nada, é preciso ter conhecimento profundo sobre o sistema de educação no qual sua escola está inserida. Não se administra sem conhecer o que é a instituição.

Em segundo lugar, você precisa ter clareza de objetivos.

Em terceiro lugar, é necessário contar com um corpo técnico bem entrosado, pois a confiança recíproca é o elemento propulsor da atividade administrativa.

E em quarto lugar é preciso transmitir à comunidade alcançada pela sua administração um nível elevado de confiança e de segurança, o que só é possível se o dirigente estiver aberto a ouvir, a dialogar e a assumir os riscos de suas decisões.

Isso tudo pode funcionar em uma escola pública, como a Faculdade de Direito da UFMG?

Creio que o sistema da administração pública difere um pouco do sistema da administração de uma escola privada. Para que isso possa ocorrer, ou primeiro, para que isso possa começar a ocorrer, é preciso reagrupar os corpos docente, discente e técnico-administrativo. Se não conseguirmos falar a mesma linguagem, vamos pregar para o vento. Por quê? Porque o que se vê de um lado não é o que se vê do outro, e com dissidência frontal você não consegue uma administração feliz.

5. Pensando ainda nessa comparação de escolas particulares e públicas, que diferença a senhora nota quanto à relação professor-aluno?

O professor de uma escola particular tem um contato mais próximo com a administração. O diretor mantém diálogo permanente e atuante com os docentes, seja na sala dos professores, seja nas reuniões com as coordenações de área, que ocorrem com maior periodicidade. O chefe de departamento é uma pessoa presente na sala dos professores. As reuniões ocorrem com muita periodicidade. Nós temos professores responsáveis por áreas determinadas, que reúnem as áreas, as disciplinas daquele grupo, com muita frequência. Então, as questões relativas ao ensino são discutidas com muito mais propriedade. Eu tenho reuniões do Conselho Superior agendadas no calendário [da Faculdade de Direito Milton Campos] e, havendo ou não assunto assunto a conversar, a reunião acontece, porque o crescimento nasce dessa união.

Na escola pública há uma divisão na administração. Há um dirigente administrativo, o Diretor, e um responsável pela direção do curso – o Coordenador do Colegiado. Além disso, há Congregação, Chefias de Departamento e nem sempre os grupos funcionam harmoniosamente. Se não houver sintonia, certamente haverá dificuldades.

Além disso, a escola pública traz uma dificuldade para fazer com que os professores efetivamente passem a integrar os núcleos de decisão. Passem a se comprometer com as decisões. É muito comum na escola pública o professor dar a sua aula e se sentir com o seu dever cumprido, sem que ele se candidate ao Colegiado, a representante na Câmara, como representante na Congregação. Então, a escola pública não agrega tanto quanto a escola particular.


6. Como vai o ensino jurídico no Brasil?

Temos uma dificuldade no ensino, que vem do primeiro grau, do ensino básico. Há estudantes que estão chegando despreparados para o curso superior. Muitas vezes há deficiência na forma de expressão. Costumo pedir aos estudantes que “Não maltratem a Língua Portuguesa, pois ela é nosso instrumento de trabalho”. A contextualização dos fatos e acontecimentos de relevância jurídica também oferece dificuldades, pois a Lei das XII Tábuas, o Código de Napoleão e outros textos importantes nem sempre se vinculam a um período histórico determinado. Outro fator relevante é a ânsia que um número significativo de alunos apresenta: como fazer? Mas, para que a prática possa ser bem exercitada, o conhecimento teórico é fundamental. Além do mais, temos o ensino jurídico muito voltado para a repetição do direito positivo, faltando a reflexão. O que tem faltado é o conhecimento de base. Ensinamos contratos, sem que o aluno se mostre firme na teoria geral dos negócios jurídicos. Discutimos a formação da família, com nulidade e anulação de casamento, e, muitas vezes, falta ao estudante a necessária segurança sobre a manifestação de vontade, sua autonomia e seus vícios.

Precisamos, cada vez mais, apuração de conteúdo, a busca da sintonia fina entre o que se estuda no início, no meio e no final do curso.

Os fatores para a avaliação concreta da qualidade dos profissionais que saem dos nossos cursos ainda não alcançaram um nível de elevada segurança, trazendo, assim, para o dirigente, a constante preocupação por um ensino de qualidade sempre ascendente.

7. A que a senhora atribui o fato de sempre estar entre os professores com maior avaliação positiva pelos alunos?

Acho que são três fatores diferenciais. Um deles é que o aluno sempre vai me encontrar na sala de aula. Eu digo a eles que nós temos um contrato e que eu vou procurar desempenhar a minha parte com a maior dignidade possível, comparecendo todos os dias e todos os horários.

Em segundo lugar, sempre levei para a sala de aula todas as novidades que acontecem no dia a dia forense (pulos do gato?), na apresentação e tramitação dos projetos de lei, nos comentários da doutrina, em especial se divergentes, nos julgamentos mais recentes, na mudança da jurisprudência e seus fundamentos, para não permitir que a aula se transforme em mero comentário da legislação fria. Mostrar ao estudante que o os fatos simples do dia a dia estão envolvidos pelo Direito, levar a ele comentários, críticas bem embasadas, discutir projetos e propostas, buscar uma dimensão diferente daquela que se encontra nos livros, despertando interesses e motivando os alunos para a importância de uma visão mais ampla dos institutos jurídicos.

E, por último, é a disponibilidade que eu sempre ofereço aos alunos para ficar mais um “tiquinho”, para discutir, para mostrar onde é que é, para retomar a Parte Geral, para retomar o Direito das Obrigações, para retomar os Direitos Reais, e fazer uma integração do Direito de Família e Sucessões quanto a isso.

8. Qual, então, a riqueza que o professor que tem larga experiência prática pode trazer para o magistério?

Veja, a realidade da aplicação do Direito é a forma que se tem para demonstrar ao aluno que ele não está estudando algo abstrato, que o Direito é vida, a la Goethe. E a vida não se desenvolve pura e simplesmente nos livros. A vida se desenvolve no dia-a-dia, ela se desenvolve no processo, ela se desenvolve nas relações familiares, ela se desenvolve na mediação. Então, não basta que se concentre nos livros, é necessário que se tenha esse sentimento de vivência, essa pulsação que dá para a gente o viés de todo dia, e a busca de continuar sendo professor, sendo advogado, sendo profissional. Porque se assim não fosse, o professor já estaria prontinho para ir para casa, assim que completasse o seu tempo de serviço.

9. Qual a pior falha que um professor pode cometer?

Achar que é infalível. É não ter disponibilidade para reconhecer que se equivocou. É entender que o seu ponto de vista é o único cabível. É não permitir ao estudante que erre e aprenda com o seu erro – eu acho que esse é o melhor momento de se aprender, quando o equívoco é cometido, porque você tem a paciência de desconstruir a ideia do aluno e ajudá-lo a reconstruir o conceito adequado. Aprendemos dois, ele porque trouxe uma ideia equivocada, que viu ser desfeita, e eu porque fui capaz de desconstruir e ajudar a construir. E isso cria um ímã entre professor e aluno que nada neste mundo é capaz de afastar.



10. A senhora experimentou alguma tristeza no exercício do magistério?

Provavelmente sim, mas eu acho que o nível de comparação entre a alegria de ser professor e o desacerto, as frustrações, é tão reduzido, que eu teria dificuldade em me lembrar de alguma. E como certamente lembrar não me daria satisfação, não quero fazer força.

11. Então, as alegrias, quais são as maiores?

Olha, uma alegria muito grande é você aplicar uma prova com um nível de exigência elevado e encontrar nas respostas dos alunos a perfeita adequação daquilo que foi ministrado. Ou seja, é você verificar que o aluno tem acompanhado, não acompanhado simplesmente para repetir, acompanhado porque o entendimento está instalado nele.

Uma segunda alegria que o professor tem é verificar que o seu aluno foi capaz de voar sozinho. É verificar que o seu aluno foi capaz de sair dali, prestar o Exame da Ordem, voltar e dizer: “Lembra daquilo que você falou na sala? Caiu na Ordem. A gente ficou reclamando, mas caiu”. Então, isso traz um retorno. O aluno que é aprovado em um concurso e desenvolve sua atividade profissional com proficiência; o aluno que também se torna professor, que se torna escritor de obras jurídicas, que apura sua formação pela via da pós-graduação, trazem retorno inestimável. Mas há também os alunos comerciantes, empresários, profissionais de outra área, que não se furtam de reconhecer que se tornaram cidadãos mais conscientes após o curso de graduação em Direito. Ou seja, não é preciso ser profissional do Direito, é preciso entender o Direito como uma ciência que abre outros horizontes para a vida pessoal.

12. Que palavra a senhora diria a um jovem, estudante de Direito, ou já graduado, que pensa em se dedicar ao magistério?

Venha!

Então, professora, muito obrigado pela conversa. É uma grande alegria ouvir os ensinamentos que a senhora comunicou a todos nós e também conviver com a senhora e aprender, no dia-a-dia, o que é ser professor. Obrigado, professora.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

"TWITTER" NA EDUCAÇÃO

Há alguns dias, coloquei duas perguntas no Twitter.

A primeira, que se dirigia a estudantes de Direito, era a seguinte: "Por que você segue seus professores no Twitter?".

E a segunda, dirigida aos professores universitários, era: "Que objetivos educacionais você pretende atingir ao utilizar o Twitter?".

Só um professor, o Marcos Lourenço Capanema (MLCapanema), a quem agradeço, enviou resposta:

"Acho que o twitter, assim como todas as ferramentas da internet, melhora a comunicação entre aluno e professor. O professor que não se adequar às novas tecnologias não conseguirá se comunicar com os jovens alunos".

Dos estudantes, todos da Faculdade de Direito da UFMG, aos quais também agradeço, recebi as seguintes respostas:

"Pela esperança de ler algo produtivo, bem digno de sair nas vozes malditas do jornal do CAAP [Centro Acadêmico Afonso Pena, da Faculdade de Direito da UFMG]..."
Marcela Barros (MarceBarros).

"Mais por curiosidade... Ver o que é que os admirados professores comentam sobre as coisas da vida, do mundo".
Elis Bastani (elisbastani).

"Os professores são exemplo. O que vemos em aula é fruto de um processo, e o twitter revela um pouco dessa construção".
Clara Coutinho (Kakau).

"Pq aprendo! mtos professores colocam coisas interessantes, para a gnt ler e descobrir, inovar, adquirir novos conhecimentos".
Lucas Paulino (lucaspaulino).

"Olha prof., sigo todo mundo q me influencia de alguma forma. Curiosidade mesmo de saber o q essas pessoas andam pensando...".
Mariana Souza (MariCFS).

Agora, caro leitor, gostaria de saber o que você pensa sobre o assunto.

O Twitter pode desempenhar algum papel importante na educação?

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

A ARTE DE PERGUNTAR

Estudiosos de metodologia da pesquisa concordam que um dos itens mais importantes na elaboração de um projeto é a formulação da pergunta.

Nas várias etapas do processo de ensino e aprendizagem, o levantamento dos problemas também é ponto dos mais relevantes.

Mas é no momento das arguições, desde as que se realizam por ocasião de provas orais, até as que se dão em sessões de defesa de teses de doutoramento, que se pode descobrir quem domina a arte de perguntar.

A partir da leitura do episódio que passo a transcrever, preservado pela crônica acadêmica, pergunto se seria possível concluir que essa era uma das muitas qualidades pedagógicas de Antonio Joaquim Ribas que, entre 1860 e 1870, foi professor catedrático de Direito Civil na Faculdade de Direito de São Paulo.

"De uma feita, perguntava ele a um examinando:
– Que se entende por – pessoa?
– Pessoa é – todo ente capaz de direitos e obrigações – respondeu-lhe o estudante.
– Que é – ente? – prossegue o dr. Ribas.
– Ente é tudo o que existe; mas entro em dúvida...
– Que é – dúvida?
Aí, o estudante hesitou, e, instintivamente, pôs-se a fazer movimento oscilatório com o indicador e o dedo maior da mão direita, dizendo:
– Dúvida, sr. dr., dúvida...
E continuava com a mímica dos dois dedos estendidos em movimento oscilatório:
– Dúvida...dúvida...
– Não diga nada! – acudiu o examinador. – O senhor não poderá encontrar definição oral tão expressiva como esse gesto que está fazendo. Dúvida é isto mesmo: é a vacilação entre dois juízos".

(NOGUEIRA, José Luís de Almeida. A Academia de São Paulo: Tradições e Reminiscências. Volume II. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1977, p. 143, 144).