sexta-feira, 12 de agosto de 2011

ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO

Texto que serviu de base à comunicação apresentada na III Semana Acadêmica, organizada pelo Centro Acadêmico Afonso Pena, na Faculdade de Direito da UFMG, em 12 de agosto de 2011.

De quantos pés uma cadeira precisa para se sustentar? Não é necessário ser muito inteligente para responder a essa pergunta. Todos concordarão que, muito embora a regra seja fabricar bancos e cadeiras com quatro pés, três bastariam para sustentá-los. Do mesmo modo, todos concordarão que são inúteis os bancos e as cadeiras com dois pés ou com apenas um, simplesmente porque, desse modo, não se sustentam.

Talvez os que nasceram na cidade grande não conheçam um equipamento muito curioso que os vaqueiros usam enquanto tiram leite das vacas. Aliás, em tempos de ordenha eletrônica, talvez nem os vaqueiros mais novos o conheçam. Trata-se de um pequeno banquinho, com uns trinta centímetros de altura, e apenas um pé. Sim, um banquinho de apenas um pé. Em minhas memórias de infância, na bela e pacata cidade de Mantena, no interior das Minas Gerais, é fácil localizá-lo. Meu pai tinha umas poucas vacas de leite e, muitas vezes, eu acompanhava o nosso vaqueiro, o Manuel, na tarefa de fazer a ordenha e, depois, atravessar a cidade para entregar o leite de casa em casa, e levar o que sobrava para a Cooperativa dos Produtores Rurais. E o Manuel usava esse banquinho. Então, o banquinho de apenas um pé não é inútil. Não, ele não é inútil, porque o vaqueiro, para se equilibrar, também usa os próprios pés. O banquinho, na verdade, serve apenas como um apoio.

Então, continua verdadeira a ideia de que, para se sustentar, os bancos e as cadeiras precisam de ao menos três pés.

Talvez por isso a Constituição da República determine que o ensino universitário brasileiro fique apoiado no tripé: ensino, pesquisa e extensão. E também pode ser por esse motivo que utiliza a ideia de indissociabilidade dos três elementos. Se um deles faltar, ainda que os outros dois estejam bem estabelecidos, a educação não se sustenta.

O ensino, muito embora nem sempre de qualidade, está sempre presente. Tal como o pé de madeira do banquinho de tirar leite. São as Faculdades ou Universidades que cuidam de oferecê-lo. Não por outro motivo nós as chamamos de instituições de ensino.

Mas pesquisa e extensão, em geral, dependem da iniciativa de professores e alunos. Nas boas instituições, há editais, financiamento e bolsas. Mas, em geral, a iniciativa é dos interessados. Tal como o vaqueiro que precisa oferecer os próprios pés para que o banquinho se sustente.

O ensino, em geral, é o ponto frágil das faculdades e universidades públicas. Os professores, em razão de sua elevada titulação, sentem-se inclinados para a pesquisa. Desejam ardentemente diminuir a permanência em sala de aula. E, não raro, reservam o pior de seu tempo e de seus esforços para o ensino. As instituições, por sua vez, ao mesmo tempo em que cobram produção acadêmica, concretizada principalmente nas orientações e nas publicações, pouco valorizam os professores que se destacam em sala de aula. É evidente, portanto, que devemos insistir na necessidade de valorizar o ensino e lutar por seu contínuo aprimoramento. Mas o ensino sempre estará lá, bom ou ruim.

Pesquisa e extensão, ao contrário, dependem do interesse e da iniciativa de professores e estudantes. Nisso talvez resida parte do encanto que possuem e das vantagens que proporcionam. Destas, seguramente, a mais importante é a experiência da autonomia. Enquanto o ensino encontra grandes restrições à inovação, para não dizer que, por vezes, permanece aprisionado nas grades do currículo, pesquisa e extensão são campos abertos. Neles, o agente inventa, descobre, surpreende-se, aprende, ensina, conversa, sonha, realiza.

As oportunidades são imensas. Basta andar de olhos abertos. Olhar os murais. Conferir as chamadas. Conversar com colegas mais experientes. Procurar. Correr atrás.

Então, nessa conversa ligeira, como se estivéssemos sentados em cima da porteira, pertinho do curral, na fazenda da minha infância querida, ouvindo os mugidos das vacas e dos bezerros, sentindo o cheiro do leite fresco, vendo o nascer do sol atrás da montanha, fica a minha recomendação: faça pesquisa e pratique extensão.

sábado, 6 de agosto de 2011

SEUS ALUNOS SABEM VOAR?


Na última reunião do CONPEDI (Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito), em Belo Horizonte, assisti a uma palestra sobre metodologia do ensino, muito bem preparada e ministrada com muita competência. Confesso que aprendi coisas muito interessantes. Mas algo me incomodou profundamente. É que o palestrante fazia questão de falar que tinha o hábito de prometer pontos para todo tipo de comportamento que esperava de seus alunos, o que garantia o sucesso de suas atividades pedagógicas. Suas aulas e palestras eram sempre muito concorridas. Os alunos recebiam uns pontinhos extras para frequentá-las. Todas as tarefas que indicava eram prontamente realizadas. Pontinhos extras para os alunos. Seu blog era muito acessado. Mais pontinhos extras.

Saí de lá e fiquei pensando no assunto. Não gostava nada daquilo. E a liberdade para aprender? E a liberdade para não aprender? E a construção ou afirmação da autonomia?

Passados alguns dias, já nas férias, fui reler um livro de um dos meus escritores favoritos, o C. S. Lewis, autor de As Crônicas de Nárnia.


Em A Abolição do Homem, o brilhante professor de Cambridge, falecido em 1963, propõe a distinção entre educação antiga e educação nova. E foi lá que eu encontrei uma resposta tranquilizadora. Poucas vezes eu desejei tanto ser antigo como no momento em que li o seguinte trecho:

"Enquanto a [educação] antiga promovia uma iniciação, a nova apenas 'condiciona'. A antiga lidava com os alunos da mesma maneira como os pássaros crescidos lidam com os filhotes quando lhes ensinam a voar; a nova lida com eles mais como o criador de aves lida com os jovens pássaros - fazendo deles alguma coisa com propósitos que os próprios pássaros desconhecem".