domingo, 22 de maio de 2016

Direito, Futebol e Poesia


O futebol, que é conhecido pela estabilidade de suas regras, realizou mudanças recentemente. Uma delas permite que a bola, no início da partida, seja tocada em qualquer direção, inclusive pra trás. E todos devem se lembrar que, antes, a bola só podia ser tocada em direção ao campo do adversário. 

No começo, pensei que a alteração era positiva, pois, se o primeiro toque era mesmo pra frente, o segundo era necessariamente utilizado para recuar a bola ao próprio campo. Seria, então, o simples reconhecimento do que já vinha sendo feito na prática.

Pois bem, a mudança até que faz sentido. O problema é que eu comecei a pensar em poesia. E aí fiquei em dúvida. Não havia certa beleza em começar o jogo tocando a bola pra frente? A regra não traduziria, nesse sentido, um símbolo? Sua aplicação não teria o propósito de insinuar que aquele jogo se joga pra frente, que os jogadores nunca devem deixar de pensar na meta, que o grande momento do futebol é justamente o gol?

O Direito brasileiro ainda proíbe o homicídio. Mas as pessoas continuam matando. O Direito brasileiro ainda proíbe o roubo. Mas as pessoas continuam roubando. É por isso que eu temo as reformas conduzidas por gente que não gosta de poesia.

sábado, 7 de maio de 2016

Os Perigos da Aula Expositiva

No semestre letivo em andamento, tenho utilizado aproximadamente um terço do tempo com aulas expositivas. Faço questão de esclarecer que elas servem apenas para indicar os fundamentos básicos da matéria e sinto que os alunos ficam muito livres para interromper e apresentar contribuições.

Mas a verdade é que eu tenho medo de aulas expositivas. Penso que elas acabam contribuindo para a sensação de que, no ambiente educacional, há apenas um sujeito que ensina, ativamente, e outros que aprendem, passivamente. Elas também criam a aparência de que o assunto estudado é simples e pode ser resumido em meia dúzia de frases. 

Na aula de ontem, observei que a maioria dos alunos anotava freneticamente tudo o que eu dizia. Percebi que, em muitas ocasiões, alguém me pedia para repetir uma frase, indicando, claramente, a tentativa de registrar as minhas palavras. E isso me deixou profundamente incomodado, sobretudo porque eu sei que eles não precisam desse tipo de expediente. Sim, eu sei que os meus alunos são brilhantes.

Foi aí que eu decidi fazer uma pequena maldade. Tendo explicado calmamente o funcionamento de dois institutos de Direito Civil, afirmei que um deles se chamava “acontecimento” e, o outro, “ocorrência”. Fiz uma pausa e, em seguida, perguntei se eles tinham anotado os nomes. Sim, eles tinham anotado. Depois disso, a primeira coisa foi pedir desculpas pela brincadeira. A segunda foi dizer que, na verdade, os institutos se chamavam “termo” e “condição”. E a terceira foi convidá-los a não deixar nas mãos de outra pessoa a responsabilidade pela condução do processo formativo.