segunda-feira, 26 de outubro de 2009

O MAGISTÉRIO É UMA VIAGEM! PREPARE-SE!*

Álvaro de Campos, heterônimo de Fernando Pessoa, disse:

"Na véspera de não partir nunca,
Ao menos não há que arrumar malas".


De fato, quem pretende ficar em casa não precisar realizar preparativos. Mas quem deseja por o pé na estrada não pode deixar de pensar no assunto.

Exercer uma profissão é como fazer uma viagem. Não é a toa que a realização continuada de qualquer tipo de trabalho é denominada carreira. Sim, carreira, jornada, caminhada, viagem.

O magistério é uma viagem.

Como se preparar para empreendê-la?

Que itens colocar na bagagem?

É evidente que o tipo de preparo prévio depende do tempo de que se dispõe para fazê-lo. Muitas vezes, os instrumentos de que o professor necessita para bem desempenhar suas funções são adquiridos ao longo de sua jornada.

Havendo possibilidade, no entanto, eu sugeriria que o interessado cuidasse de colocar na mala os seguintes itens:

1. Caráter

Paulo Freire, em Pedagogia da Autonomia, afirma que:

“Quem pensa certo está cansado de saber que as palavras a que falta a corporeidade do exemplo pouco ou quase nada valem”.

O que se candidata ao magistério deve cuidar de explorar suas próprias fragilidades, identificando os pontos que devem ser trabalhados, para, em seguida, empregar todos os recursos a que puder ter acesso a fim corrigi-los e avançar rumo a novos desafios.

Do contrário, ficará obrigado a ver suas palavras desmentidas, diariamente, pelo modo como se comporta.

Dizer que caráter é item que deve ser colocado na bagagem é acreditar que o homem pode experimentar mudanças interiores, pequenas ou grandes. E eu acredito nisso.

2. Paixão

Rubem Alves, em Conversas com Quem Gosta de Ensinar, propõe a seguinte reflexão:

“Se nem nós estávamos em nosso discurso, como poderíamos pretender que aqueles que a escola nos entregou como alunos estivessem?”

Se o professor não acredita no que pensa, no que diz, ou no que faz, nunca poderá provocar reações positivas em seus alunos.

O magistério não é daquelas profissões a que os praticantes podem se entregar mecanicamente, esperando o término do expediente para buscar realização e felicidade.

O professor, muito embora afligido por angústias e dificuldades, deve ser feliz enquanto realiza o seu ofício.

Se a paixão pelo ensino não estiver na bagagem, o trajeto promete muito sofrimento, tanto para o viajante quanto para aqueles que tiverem o azar de se encontrar com ele.

3. Conhecimento

Rui Barbosa, na sua Oração aos Moços, confessou:

“Estudante sou. Nada mais. Mau sabedor, fraco jurista, mesquinho advogado, pouco mais sei do que saber estudar, saber como se estuda, e saber que tenho estudado”.

Para o bom exercício de suas tarefas, o professor deverá utilizar conhecimentos amplos e variados.

E bem fará o candidato ao magistério jurídico se trouxer, dos bancos acadêmicos, bons elementos de Filosofia e de História; do Direito, em geral, e especialmente do ramo a que pretende se dedicar; de línguas estrangeiras, principalmente das que forem mais úteis ao objeto de suas futuras pesquisas; de Didática e de Metodologia do Ensino Superior; e, por fim, de tudo que for útil para que tenha vernaculidade.

A lista, embora ampla, não deve servir para desanimar os candidatos.

Quanto a mim, preciso dizer que comecei a viagem sem estar minimamente preparado em alguns desses itens, e ainda hoje me sinto bastante inseguro em muitos deles.

É o caso de colocar na mala, antes do embarque, exatamente tudo o que for possível, mas não deixar de acrescentar outros objetos enquanto a viagem acontece.

4. Experiência

Experiência no magistério só se poderá obter no exercício do magistério. Nada mais evidente.

Mas há certas atividades que poderiam ser muito proveitosas aos candidatos à docência, especialmente três: monitoria, iniciação científica, participação no movimento estudantil.

Com a primeira, pelo convívio diário com o orientador, o interessado poderia perceber o modo como são realizadas as mais diversas tarefas ligadas ao magistério, desde a preparação de aulas, até o preenchimento de relatórios. Com a segunda, experimentaria a pesquisa, atividade a que o futuro professor deverá necessariamente se dedicar. Com a terceira, obteria elementos que o poderiam ajudar no exercício de funções administrativas.

Desse modo, envolvendo-se com tais atividades e outras semelhantes, o estudante que se sente chamado para o magistério poderá começar a obter aquilo de que fala o Camões: “um saber só de experiências feito”.

CONCLUSÃO

Esses são apenas alguns elementos que os interessados deveriam colocar na bagagem. Trazê-los consigo pode tornar o percurso um pouco mais suave. Mas não evita os imprevistos, nem impede os acidentes. Afinal, como disse o Rosa:

“O real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia”.

*Essas questões foram apresentadas aos participantes do I Congresso da CORED-MG, realizado na Faculdade de Direito da UFMG, em 24 de outubro de 2009.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

COMO SE PREPARAR PARA O MAGISTÉRIO?

Se exercer o magistério fosse como empreender uma longa viagem, que itens o interessado deveria colocar na bagagem?

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

HOMENAGEM AOS MESTRES

Não consigo terminar uma aula e deixar o quadro sem apagar.

Quando um aluno, ao apresentar um trabalho, começa a falar muito baixo, tento me colocar no extremo oposto da sala de aula.

Gosto de entregar e discutir o plano de ensino logo no primeiro encontro.

Tenho o hábito de verificar as expectativas da turma no início de cada semestre.

Sempre destino a primeira aula para que professor e alunos se apresentem.

De vez em quando, leio trechos de obras literárias em sala de aula.

Não aprendi nenhum desses procedimentos em livros de didática ou de metodologia do ensino.

Sem que eu me desse conta, todos acabaram se incorporando à minha prática pedagógica.

Só agora percebo que eles me foram emprestados por meus antigos mestres.

Sim, o que, hoje, sou, também como professor, devo-o, em grande parte, aos meus mestres.

O que me faz lembrar de Fernando Pessoa, escrevendo sob o heterônimo de Álvaro de Campos:

“Em quantas coisas que me emprestaram guio como minhas!
Quanto me emprestaram, ai de mim!, eu próprio sou!”


Aos meus mestres, portanto, por tudo o que me emprestaram, minha gratidão, sempre, e minha homenagem, hoje, Dia do Professor!

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

31 DE FEVEREIRO: DIA DO PROFESSOR!

15 de outubro era o dia do professor.

O Calendário Acadêmico da UFMG, há alguns anos, determina que a data seja comemorada em 28 de outubro, que é Dia do Servidor Público.

A PUC/MG, estabeleceu que, nesse ano, a data será lembrada em 13 de outubro, dia imediatamente posterior ao de um feriado nacional.

Para duas das maiores universidades do País, portanto, não faz muita diferença reservar um dia específico para que o professor seja homenageado.

Para evitar arbitrariedades, sempre indesejáveis, e para não atrapalhar a vida de ninguém, proponho que, de agora em diante, 31 de fevereiro seja o Dia Nacional do Professor. Sugiro, ainda, que a data jamais possa ser alterada. E que, nela, não se faça outra coisa senão celebrar a existência e reconhecer a dedicação dos nossos mestres.

Estou seguro de que, pelo menos nesse dia, o professor será lembrado e reconhecido. E quem sabe, com o passar dos anos e com o costume de se comemorar a data sempre em dia tão especialmente reservado, o Brasil não dê ao magistério o valor que ele merece!

terça-feira, 6 de outubro de 2009

O SEGREDO DE RUI BARBOSA

Em 1870, Rui Barbosa concluiu o bacharelado na Faculdade de Direito de São Paulo. Cinqüenta anos depois, ouviu-se, na mesma Escola, a leitura de um discurso de paraninfo, por ele composto, publicado, posteriormente, sob o título de Oração aos Moços. Trata-se de singular peça de oratória, tida, por João Baptista Villela, como um dos dez mais belos textos escritos em língua portuguesa. Dele, escolhi transcrever um pequeno trecho, apto a sugerir, a estudantes e estudiosos, do Direito e de outras Ciências, o caminho para se obter verdadeiro sucesso nos estudos.

"Estudante sou. Nada mais. Mau sabedor, fraco jurista, mesquinho advogado, pouco mais sei do que saber estudar, saber como se estuda, e saber que tenho estudado. Nem isso mesmo sei se saberei bem. Mas, do que tenho logrado saber, o melhor devo às manhãs e madrugadas. Muitas lendas se têm inventado, por aí, sobre excessos da minha vida laboriosa. Deram, nos meus progressos intelectuais, larga parte ao uso em abuso do café e ao estímulo habitual dos pés mergulhados n'água fria. Contos de imaginadores. Refratário sou ao café. Nunca recorri a ele como a estimulante cerebral. Nem uma só vez na minha vida busquei num pedilúvio o espantalho do sono.

Ao que devo, sim, o mais dos frutos do meu trabalho, a relativa exuberância de sua fertilidade, a parte produtiva e durável da sua safra, é às minhas madrugadas. Menino ainda, assim que entrei ao colégio, alvidrei eu mesmo a conveniência desse costume, a daí avante o observei, sem cessar, toda a vida. Eduquei nele o meu cérebro, a ponto de espertar exatamente à hora, que comigo mesmo assentava, ao dormir. Sucedia, muito amiúde, encetar eu a minha solitária banca de estudo à uma ou às duas da antemanhã. Muitas vezes me mandava meu pai volver ao leito; e eu fazia apenas que lhe obedecia, tornando, logo após, àquelas amadas lucubrações, as de que me lembro com saudade mais deleitosa e entranhável.

Tenho, ainda hoje, convicção de que nessa observância persistente está o segredo feliz, não só das minhas primeiras vitórias no trabalho, mas de quantas vantagens alcancei jamais levar aos meus concorrentes, em todo o andar dos anos, até à velhice. Muito há que já não subtraio tanto às horas da cama, para acrescentar às do estudo. Mas o sistema ainda perdura, bem que largamente cerceado nas antigas imoderações. Até agora, nunca o sol deu comigo deitado e, ainda hoje, um dos meus raros e modestos desvanecimentos é o de ser grande madrugador, madrugador impenitente".

(BARBOSA, Rui. Oração aos Moços. Rio de Janeiro: Ediouro, p. 61-63).

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

RUI BARBOSA RECOMENDA

Rui Barbosa, quando perguntado sobre como se poderia adquirir vernaculidade, recomendou a leitura de Padre Vieira. Pensando nisso, ao final de uma aula, li um trecho, a seguir transcrito, de um magnífico sermão do religioso português.

A partir dele, é possível dizer se Rui tinha razão. Sobre isso, cada um pense o que quiser.

Não pode haver dúvida, porém, quanto à completa irrelvância contemporânea do assunto discutido pelo pregador no distante ano de 1650.

Felizmente, os problemas de que cogita há muito já não nos assolam mais!

Com a palavra, então, o Padre Vieira:

"Quais serão as consequências de um voto injusto em um tribunal? Quais serão as consequências de um voto apaixonado em um conselho? Ajude-me Deus a saber-vo-las representar, pois é matéria tão oculta e de tanta importância. Consulta-se em um conselho o lugar de um vice-rei, de um general, de um governador, de um prelado, de um ministro superior da Fazenda ou Justiça: e que sucede? Vota o conselheiro no parente, porque é parente; vota no amigo, porque é amigo; vota no recomendado, porque é recomendado: e os mais dignos e os mais beneméritos, porque não têm amizade, nem parentesco, nem valia, ficam de fora. Acontece isto muitas vezes? Queira Deus que alguma vez deixe de ser assim. Agora quisera eu perguntar ao conselheiro que deu esse voto e que o assinou, se lhe remordeu a consciência, ou se soube o que fazia? Homem cego, homem precipitado, sabes o que fazes? Sabes o que firmas? Sabes que ainda que o pecado que cometeste contra o juramento de teu cargo seja um só, as consequencias que dele se seguem são infinitas e maiores que o mesmo pecado? Sabes que com essa pena te escreves réu, de todos os males que fizer, que consentir, e que não estorvar esse homem indigno por quem votaste, e de todos os que dele se seguirem até o fim do mundo? Oh grande miséria! Miserável é a república onde há tais votos; miseráveis são os povos onde se mandam ministros feitos por tais eleições; mas os conselheiros que neles votaram são os mais miseráveis de todos: os outros levam o proveito, eles ficam com os encargos”.

(VIEIRA, António. Sermão da Primeira Dominga do Advento. In: VIEIRA, António. Sermões. Tomo I. Porto: Lello e Irmão, 1959, p. 61).