segunda-feira, 19 de março de 2018

Rubem Alves e as dimensões do planejamento pessoal

Quando ouvia a pergunta “quantos anos você tem?”, Rubem Alves tinha uma resposta padrão: “Não sei”. E se o interlocutor fizesse cara de dúvida, ele explicava: “Não sei quantos anos ainda tenho pela frente; é impossível saber. Mas apenas quantos não tenho, que são exatamente os que eu já vivi”. 

Ao falar desse modo, é possível que o escritor mineiro tivesse em mente a seguinte advertência bíblica, registrada na Carta de Tiago:

Ouçam agora, vocês que dizem: "Hoje ou amanhã iremos para esta ou aquela cidade, passaremos um ano ali, faremos negócios e ganharemos dinheiro”. Vocês nem sabem o que lhes acontecerá amanhã! Que é a sua vida? Vocês são como a neblina que aparece por um pouco de tempo e depois se dissipa. Ao invés disso, deveriam dizer: "Se o Senhor quiser, viveremos e faremos isto ou aquilo".

Todo cristão deveria saber que seus projetos são falíveis. Na verdade, qualquer pessoa, independentemente do modo como encara a vida, já teve expectativas frustradas e sabe como isso pode ser desagradável. 

Ainda assim, o planejamento pessoal tem o seu lugar e todos podem tirar proveito do hábito de elaborá-lo.

A primeira dúvida é sobre o lapso temporal que deve ser coberto pelo exercício. E cada um deve descobrir o que faz sentido para seus propósitos. Eu gosto de fazer planos anuais, mensais, semanais e diários.

No planejamento anual, além de revisar a missão, é o momento de estabelecer ou avaliar as metas pessoais. No entanto, pode ser interessante não trabalhar com um número excessivo. Christian Barbosa recomenda, no máximo, oito metas para o período de um ano. E isso não significa que todas devam ser atingidas nesse intervalo. É só lembrar que as metas de médio e longo prazo abrangem vários anos. O negócio é pensar naquelas que serão objeto de atenção nos próximos 365 dias. 

O principal propósito do planejamento mensal é definir as metas que terão atenção prioritária no período. Christian Barbosa sugere, no máximo, quatro.

No planejamento semanal, é hora de afunilar mais um pouco e escolher duas metas para atenção prioritária. Para Christian Barbosa, é nesse momento que se deve elaborar a listas das tarefas que serão executadas no dia-a-dia. Para ele, a semana é a unidade básica do planejamento.

O planejamento diário, para quem decide fazê-lo, é o momento certo para a distribuição das atividades. Ao realizá-lo, deve-se observar os projetos em curso e as metas prioritárias e, a partir daí, escolher as tarefas que serão enfrentadas ao longo do dia. Descontas as horas já ocupadas com compromissos, é possível saber quantas estão disponíveis para trabalho. Ao listar as tarefas, além de prever as horas ou os minutos que serão gastos em cada uma, deve-se cuidar de classificá-las como importantes, urgentes ou circunstanciais, pois, somente assim, será possível avaliar a qualidade de utilização do tempo.

Vanderlei Luxemburgo e os itens básicos de um “pojeto"

Eu juro que tento evitar, mas quando penso na palavra “projeto”, o nome que me vem imediatamente à cabeça é o de Vanderlei Luxemburgo, muito embora, para o “pofexor”, a “ponúncia" correta seja “pojeto”. 

Quem acompanha o futebol brasileiro, sabe que o talentoso treinador, depois de obter sucesso na década de 1990 e no início dos anos 2000, vem colecionando experiências desastrosas em quase todos os clubes da primeira divisão. Mas, nas entrevistas de estreia e sempre que o time perde uma partida importante, é inevitável que ele diga a frase: “Voxês xabem que eu xó tabalho com pojeto”.

E trabalhar com projeto, na verdade, ainda que não garanta o sucesso da iniciativa, pode ser mesmo uma boa escolha. Aliás, sempre que um objetivo exige a realização de duas um mais atividades, esse é o melhor modo de alcançá-lo.

No curso de “Introdução à Administração”, Antonio Maximiano define projeto como “atividade com começo e fim programados, que têm o objetivo de fornecer um produto singular”.

Evidentemente, uns podem ser muito simples e outros muito complexos. Se houver várias pessoas envolvidas, por exemplo, será necessário incluir um item sobre equipe, com distribuição de tarefas e mecanismos de acompanhamento. Se for necessário mobilizar recursos financeiros, será o caso de elaborar um orçamento. No entanto, no caso de um projeto feito no âmbito do planejamento pessoal, pode ser suficiente trabalhar com apenas três elementos: objetivo, atividades e prazos.

Objetivo é o resultado que se deseja obter com o projeto. É preciso descrevê-lo com clareza.

Atividades são as tarefas e os compromissos que deverão ser realizados para alcançar o objetivo proposto. No caso de uma tarefa, deve-se assinalar o dia em que ela será realizada. No caso de um compromisso, além do dia, também é necessário prever o horário. Ainda pode ser conveniente estabelecer a ordem de prioridade para a realização dos itens indicados. 

Prazos são os marcos temporais dispostos no planejamento. Para cada projeto, deve-se anotar a data de início e a data marcada para a conclusão. Além disso, é preciso prever o tempo a ser consumido em cada tarefa ou compromisso, bem como o total das horas reservadas para o projeto como um todo.

Assim, se um estudante deseja se preparar para uma prova de monitoria, pode ser conveniente elaborar um projeto. Para isso, depois de descrever o objetivo, o próximo passo será listar as atividades, anotando, por exemplo, as tarefas de “fazer a inscrição”, “obter os textos indicados na bibliografia de referência” e “ler os textos indicados”, com o dia para realização e o tempo previsto para cada uma, além de compromissos como “realizar a prova escrita” e “participar da entrevista”, com indicação de data e horário. Se desejar, também pode estabelecer a ordem de prioridade de cada uma das atividades previstas. Em seguida, deve cuidar dos prazos, registrando a data de início e a data prevista para o término, o tempo previsto para cada atividade e o número de horas reservadas para a conclusão do projeto.

Mas não basta elaborar “pojetos". É preciso por a mão na massa. Do contrário, será o caso ter uma boa lista de desculpas para explicar objetivos jamais alcançados.

sábado, 17 de março de 2018

Dom Quixote e a diferença entre sonhos e metas

Ninguém pode acusar Dom Quixote de não ter sonhos. Talvez lhe faltasse apenas uma certa dimensão prática e a capacidade de antever os alvos com clareza.

Depois de adquirir todos os livros de cavalaria que encontrou e de passar dias e noites lendo e lendo, sem parar, esquecendo-se de todas as outras atividades, vejam o que aconteceu ao nobre fidalgo:

Por fim, perdido o resto de juízo que ainda conservava, ocorreu-lhe o mais estranho pensamento que jamais passara pela cabeça de outro louco neste mundo: pareceu-lhe conveniente e necessário, tanto para o engrandecimento de sua honra como para o proveito da república, fazer-se cavaleiro andante, e sair pelo mundo com armas e cavalo, em busca de aventuras, e a exercitar-se em tudo o que havia lido acerca das práticas dos cavaleiros andantes, desfazendo todo gênero de agravos, enfrentando agruras e perigos, a fim de que, vencendo, pudesse granjear fama e nome eternos.

Tomada a decisão, Dom Quixote ainda se lembrou de algumas providências. 

Em primeiro lugar, restaurou as armas que haviam pertencido a seus bisavós, uma vez que, “cobertas de ferrugem, jaziam esquecidas há séculos num canto”.

Em seguida, gastou quatro dias pensando no nome que daria a seu cavalo, escolhendo, por fim, o de Rocinante que, para ele, era “eminente e sonoro, e que, ademais, indicava o que o animal havia sido outrora, quando não passava de um rocim, antes de ser o que agora era: o que vinha primeiro e antes de todos os rocins do mundo”. 

A terceira medida foi dar a si, depois de oitos dias de pensamento, o nome de Dom Quixote de la Mancha, “com o que, na sua opinião, declarava alto e bom som sua linhagem e pátria, honrando-a com o tomar-lhe emprestado o seu sobrenome”.

E por fim cuidou de escolher uma dama, para que dela se enamorasse, “já que cavaleiro andante sem amores era árvore sem folhas e frutos, e corpo sem alma”. A escolhida não passava de simples camponesa, moradora da aldeia vizinha, a quem decidiu chamar Dulcinéia del Toboso, nome que, “a seu ver, era musical, peregrino e significativo, como aliás os demais que dera a si e atribuía às suas coisas”.

Depois de concluir preparativos tão singelos, o nobre fidalgo deixou logo sua casa, sem saber exatamente para onde ia, pois, “não quis ele protelar por mais tempo a realização dos seus planos, servindo-lhe como incentivo a falta que, no seu entender, estaria fazendo ao mundo a sua tardança, tantos eram os agravos que tencionava desfazer, os tortos a endireitar, as injustiças a emendar, os abusos a reduzir e as dívidas a saldar”.

Não que o caminho tenha deixado de lhe reservar grandes surpresas e extraordinárias aventuras, mas todos podem concordar que o nosso cavaleiro andante não foi um planejador muito meticuloso. 

É por isso que pode ter alguma importância distinguir sonhos, metas e projetos, uma vez que, embora todos se refiram a objetivos futuros, somente os dois últimos cuidam da dimensão prática.

Nas próximas linhas, discutiremos as características que as metas devem possuir, deixando para o texto seguinte o estudo dos projetos.

Baseados principalmente em “A Tríade do Tempo”, de Christian Barbosa, podemos definir meta como um objetivo pessoal, relevante, desafiador, possível, específico, mensurável e temporal.

Pessoal é o objetivo que diz algo sobre quem o formula e, portanto, está ligado à sua missão e aos seus papéis.

Relevante é o objetivo que pode ter impacto no futuro, que tem aptidão para levar o autor a uma nova dimensão.

Desafiador é o objetivo que implica em algum tipo de risco, que demanda a mobilização de recursos significativos.

Possível é o objetivo para cuja realização o interessado disponha de recursos ou, no mínimo, tem possibilidade de obtê-los. 

Específico é o objetivo elaborado de modo a permitir que seu autor tenha elementos para suficientes para visualizar, desde logo, a sua realização. 

Mensurável é o objetivo formulado de tal forma que, depois de algum tempo, seja possível dizer com segurança se ele foi ou não alcançado.

Temporal é o objetivo com indicação de data para acontecer.

Assim, por exemplo, um estudante do primeiro período do curso de Direito, que deseja trabalhar com tributos, poderia formular a seguinte meta: realizar um ano de estágio em escritório de Direito Tributário, localizado na mesma cidade onde estudo, classificado entre os melhores do ramo, a partir do sétimo período do curso. 

Nesse caso, o objetivo seria pessoal, pois está conectado com o desejo de trabalhar com tributos; relevante, pois pode produzir impactos na carreira escolhida; desafiador, pois implica no risco de disputar a vaga em processos seletivos geralmente muito concorridos; possível, pois o escritório está localizado na mesma cidade do curso e esse tipo de vaga é destinada a estudantes de Direito; específico, pois indica não só a especialidade do escritório, mas também a sua avaliação perante a comunidade; mensurável, pois indica o período de um ano para sua realização; e também temporal, pois assinalada o momento a partir do qual deve acontecer. 

Pode ser interessante pensar em metas de curto prazo (de até um ano), de médio prazo (de até cinco anos) e de longo prazo (de mais de cinco anos) e, em seguida, registrá-las em alguma base de dados.

No planejamento, a ser feito no início do dia, do mês ou do ano, as metas devem ser observadas e desdobradas em tarefas.

sexta-feira, 16 de março de 2018

Ariano Suassuna e planejamento pessoal

Caso tenha dado os passos sugeridos anteriormente, você já deve estar com dois documentos importantes. O primeiro é um esboço de sua missão. O segundo é uma lista de tarefas pendentes. E também já possui elementos para classificar as atividades em importantes, urgentes e circunstanciais. 

No entanto, para avançar no planejamento pessoal, precisamos introduzir quatro novos conceitos. 

1. Compromissos e tarefas

O tempo que dedicamos ao trabalho é basicamente preenchido com compromissos e tarefas. 

Compromissos são atividades com hora marcada para começar e, preferencialmente, para terminar. Em geral, mas não necessariamente, envolvem a participação de outras pessoas, tais como chefes, clientes, colegas de trabalho ou integrantes de uma equipe. Entram nessa categoria, por exemplo, reuniões, eventos e aulas.

Tarefas são atividades que não precisam ser feitas em horários específicos. 

2. Projetos e metas

Muito embora compromissos e tarefas possam figurar na agenda de modo avulso, é possível organizá-los no interior de projetos e metas. Na verdade, esse é o modo de colocá-los a serviço da missão pessoal.

De acordo com Christian Barbosa, meta é um “objetivo (ou sonho) definido por escrito, de realização possível, importante e que você realmente queira alcançar”.

Um projeto é diferente por duas razões. A primeira tem a ver com a importância, que é menor. E a segunda tem a ver com a dificuldade, que também é menor. 

Ambos se relacionam com a missão e podem concorrer para o seu sucesso. Mas enquanto a meta é uma aposta mais alta e mais arriscada, o projeto não passa da previsão de um objetivo e da descrição dos passos necessários para alcançá-lo. 

3. E o que Ariano tem a ver com isso?

Acho que uma historinha pode ajudar na visualização dos conceitos.

Em 1990, Ariano Suassuna tomou posse na Academia Brasileira de Letras. No dia seguinte ao da cerimônia, convidado por um “casal rico”, participou de um jantar em sua homenagem. A anfitriã, com vontade de puxar assunto, dirigiu a ele a seguinte pergunta: - “Você naturalmente já foi à Disney, não é?”. Tendo respondido que não, que nunca fora à Disney, a mulher replicou: - “Mas o senhor foi aos Estados Unidos e não foi à Disney?”. Ele calmamente respondeu que nunca tinha ido aos Estados Unidos, aliás, nunca tinha saído do Brasil. E uma vez que a mulher não conseguia esconder a decepção, Ariano imaginou que talvez ela dividisse “a humanidade em duas categorias: quem foi à Disney e quem não foi”.

A sessão de posse na Academia e o jantar de gala deveriam ter aparecido na agenda de Ariano como compromissos, uma vez que eram atividades com hora marcada para começar. Como parte da preparação para os eventos, podemos supor que ele tenha elaborado um discurso e comprado alguma lembrança para o casal de anfitriões, atividades que, não tendo hora certa para acontecer, deveriam ter sido previstas como tarefas.

A ideia de fazer uma nova viagem para a Disney, no caso da dona da festa, não exigiria mais do que a elaboração de um projeto, com previsão de ações a realizar, tais como renovar passaporte, adquirir passagens e fazer reservas. Mas no caso de Ariano, uma ideia desse tipo, naquele momento da vida, teria a estrutura de meta, uma vez que implicaria em desafios de elevada complexidade.

No final das contas, Ariano não foi à Disney. Parece que não se interessou pelo programa. Mas os livrinhos que escreveu ainda estão aí e podem ser lidos com grande proveito.

quinta-feira, 15 de março de 2018

Que tipo de gente ainda compra agenda de papel?

Meus amigos sabem que não sou fã de novas tecnologias. Nunca li um livro digital, por exemplo. Mas quero deixar claro que não compro agendas de papel. Isso mesmo. Já abandonei esse velho hábito. Não vejo graça naquelas bancas que as livrarias organizam no mês de janeiro e que, aliás, ficam menores a cada ano. Quero deixar bem claro, então, que não compro agendas de papel. Na verdade, de uns tempos pra cá, eu mesmo fabrico minhas agendas de papel. Como? É simples. Eu explico. 

Antes, no entanto, preciso dizer que o essencial é ter uma agenda, de papel, de plástico, de ferro, de alumínio, de papiro ou mesmo num desses aparelinhos que as pessoas usam como extensão do corpo. E a razão é simples: não dá para organizar a vida se as informações permanecem apenas na cabeça ou se estão espalhadas em diferentes locais. É preciso colocar tudo no mesmo ambiente, que deve ser simples, adaptável, portátil e, de preferência, barato. Não consigo pensar em nada melhor que uma agenda de papel, feita sob medida, mas cada um deve encontrar o próprio estilo.

Para fabricar uma agenda de papel, o primeiro passo é comprar um caderno pautado. Eu prefiro o “Mais”, da “Tilibra”, com 96 folhas, que custa por volta de R$5,00. 

Depois, é preciso criar divisões internas. Eu sempre trabalho com três. 

Na parte inicial, que é o “Calendário”, anoto os dias, de modo que segunda, terça e quarta fiquem numa página, e quinta, sexta, sábado e domingo, na página ao lado. Assim, consigo visualizar a semana inteira. Reservo seis linhas para o registro dos compromissos dos dias úteis (de segunda a sexta) e duas para os demais (sábado e domingo). Em geral, para cada caderno, anoto os dias correspondentes a apenas três ou quatro meses. 

A próxima parte fica com o nome de “Missão, metas e projetos” e é nela que registro informações sobre esses tópicos, para que possa consultá-las a qualquer momento e em qualquer lugar. 

A parte final, que chamo de “Planejamento e registro”, é reservada para anotações diárias. No início do mês, uso uma página para registrar as prioridades do período. E faço o mesmo para o início da semana. No começo de cada dia, anoto as tarefas que pretendo realizar, classificando-as como importantes, urgentes ou circunstanciais, e prevendo o tempo destinado a cada uma delas. E é também nessa parte que faço registros das reuniões que frequento, das palestras e sermões que escuto, das leituras que realizo, das ideias que me ocorrem e de outras coisas que me parecem úteis, tendo sempre o cuidado de destacar itens que demandam atenção futura, para, em seguida, transformá-los em ações, tarefas ou compromissos. 

Na verdade, eu me sinto muito feliz com esse tipo de ferramenta. Percebo que, ao utilizá-la, além de organizar bem as atividades, fico conectado com o meu próprio tempo. Afinal, as pessoas não devem ter medo de inovar. A vida exige coragem. E ousadia.

sexta-feira, 2 de março de 2018

A primeira tarefa é esvaziar a mochila

“O Peregrino”, um dos maiores clássicos da literatura cristã, foi publicado em Londres, no final do século XVII. Ao escrevê-lo, John Bunyan, que era um homem simples, de quase nenhuma instrução formal, estava preso, por conta de suas pregações independentes, feitas sem autorização da Igreja Anglicana. O livro inteiro é belíssimo e ainda tem muito a nos dizer. No entanto, para ilustrar o tema que me interessa, basta a leitura do primeiro parágrafo:

Andando pelas regiões desertas deste mundo, achei-me em certo lugar onde havia uma caverna; ali deitei-me para dormir e, dormindo, tive um sonho. Vi um homem vestido de trapos, de pé em determinado lugar, com o rosto voltado para o lado oposto da própria casa, um livro na mão e um grande fardo às costas. Olhei e o vi abrir o livro, e lê-lo; e lendo, chorava e tremia, e já não se contendo rebentou num choro sentido, dizendo: “Que devo fazer?”.

Quem deseja percorrer o Caminho de Santiago, ou qualquer outra rota de peregrinação, deve tomar inúmeras precauções. Uma das mais importantes é pensar cuidadosamente no tamanho da mochila. Levar muito peso pode deixar a caminhada insuportável. Mas esquecer um item essencial pode gerar desconforto e sofrimento. E ao peregrino que deseja viajar não apenas nas estradas poeirentas, mas também nos caminhos do coração, cada item da viajem é uma oportunidade para meditar.

Especificamente sobre a mochila, José María Alvear, no manual denominado “El Camino de Santiago: cuaderno del peregrino”, faz a seguinte advertência:

Se tienes que cargar con tus cosas, aprende a hacer bien tu mochila. Non metas em ella nada que non sea imprescindible, porque el Camino te invita a andar ligero de equipaje. 

Numa peregrinação espontânea e artificial, como a que certas pessoas fazem no Caminho de Santiago, ou numa peregrinação necessária e real, como a que todos fazemos, a natureza e o tamanho do fardo importam, e muito.

É certo que a ideia permite aplicações profundas, como a que faz John Bunyan, por exemplo. Mas o meu desejo é utilizá-la para falar de algo extremamente simples.

O primeiro passo para fazer um bom planejamento pessoal é tirar da mochila tudo o que não é importante. Isso significa que, antes de pensar em objetivos e metas, é conveniente realizar o exercício que Christian Barbosa chama de “descarregar”. 

E para deixar o trabalho um pouco mais fácil, sugiro dividi-lo em três momentos.

1. Liste as pendências

Abra um arquivo novo ou pegue uma folha de papel e escreva todas as atividades que você precisa fazer. Ainda não é o momento de pensar na importância das tarefas. Faça a lista mais abrangente que puder. 

2. Pense na missão e nos papéis

Em seguida, compare a lista das tarefas pendentes com as anotações que você tiver feito sobre a sua missão e os seus papéis. Tente perceber como cada uma delas se conecta com os seus interesses mais verdadeiros. Imagine que impactos poderiam ser produzidos no futuro se você fizesse algumas e deixasse de fazer outras.

3. Elimine o supérfluo.

Finalmente, com muita coragem, elimine as tarefas que não sejam nem importantes nem urgentes.