quarta-feira, 25 de agosto de 2010

ALÉM DO DIREITO

A principal obrigação do professor é proporcionar situações de aprendizagem relacionadas à sua matéria. Assim é que professores de Direito Civil devem cuidar de discutir Direito Civil e professores de Direito Penal devem cuidar de discutir Direito Penal.

Mas é apenas esse o papel do professor?

Recentemente, uma conversa que tive com o meu cabeleireiro me fez pensar que não. Ele me contou a história de um de seus clientes. O sujeito, geralmente alegre e muito falante, passou a se comportar de um modo estranho. Não contava as piadas de sempre, não sorria, e nem respondia às perguntas que lhe eram feitas. E assim permaneceu por uns quatro meses. Até que um dia, muito discretamente, resolveu explicar que o período de tristeza e silêncio tinha a ver com a ideia de por fim à própria da vida, abandonada depois da ajuda de um amigo. A revelação fez com que o cabeleireiro ficasse pensativo. Depois disso, a possibilidade de que a pessoa sentada na cadeira à sua frente estivesse pensando em algo tão extremo e talvez precisasse de uma palavra de alento passou a lhe parecer terrivelmente perturbadora.

Mas qual o papel do cabeleireiro?

2 comentários:

Marcelo Sarsur disse...

Meu caro professor,

Sua indagação é profundamente oportuna. No meu humilde entender, o papel do professor de Direito é muito maior do que a transmissão de enunciados sobre a lei, a jurisprudência ou as correntes doutrinárias em entrechoque. O principal papel do magistério jurídico deve ser o de formar soldados da Constituição.

O Direito, ao contrário de qualquer outro campo, não pode ser ensinado de modo asséptico, avalorado. O Direito consiste num conjunto de disposições normativas orientadas pelo texto constitucional. Fora da Constituição, do Estado Democrático de Direito, não há Direito que valha ser operado ou estudado. Assim, o ensino do Direito passa, necessariamente, pela defesa intransigente dos valores consagrados pela Constituição, pela defesa da pessoa humana e de seus direitos fundamentais, pouco importa a disciplina ministrada. É preciso formar, nos alunos, a consciência de sua função social como guardiões e intérpretes privilegiados da ordem jurídica, sob a égide da Constituição.

Todos nós temos um compromisso com a ordem constitucional e com o Estado democrático. Para os professores de Direito, este compromisso deve ser exponencialmente maior. Que aqueles que buscam a formação jurídica tenham consciência de que a luta pelo Direito se faz todos os dias, não é um fato esquecido ou um dado histórico.

Abraços do leitor assíduo, contente em poder ver, nestas páginas, esta reflexão tão importante.

Giordano Bruno Soares Roberto disse...

Caríssimo Marcelo,

Suas observações são brilhantes, e muito coerentes com sua prática pedagógica.

Mas a minha angústia continua: colaborar para que o aluno se torne um soldado da Constituição é suficiente?

O que o meu cabeleireiro diria sobre isso?

Um abraço,

Giordano.