sábado, 25 de junho de 2011

A MORTE E A VIDA

Na semana passada, fui a dois velórios, de dois professores. De dois grandes professores. Ambos tinham aproximadamente 90 anos. Ambos haviam sido diretores de importantes instituições de ensino. Ambos ainda trabalhavam nessas instituições mesmo depois da aposentadoria. Ambos eram tidos como grandes mestres e grandes administradores. Em ambos os casos, houve suspensão das atividades escolares e decretação de luto oficial.

Uma das cerimônias aconteceu num auditório lotado, com mais de 400 pessoas. A viúva, os filhos, os netos e os bisnetos em volta do caixão. Uma multidão de amigos e ex-alunos. Uma dezena de discursos emocionados. Hinos. Poesias. Lágrimas. Abraços. Gratidão.

Na outra, umas vinte ou trinta pessoas. Na maioria, colegas de trabalho. Da família, acho que um neto, apenas. Um único discurso, oficial, breve e frio.

E eu fiquei pensando na vida. E na morte.

terça-feira, 21 de junho de 2011

PROFESSORES IMPONTUAIS

Quando eu estudava Direito, uma das coisas que mais me aborrecia era a impontualidade dos professores. Eu simplesmente não podia entender porque as aulas não começavam no horário. Imaginava que seria muito melhor iniciar na hora indicada e terminar um pouco mais cedo, caso não houvesse necessidade de utilizar todo o tempo.

Havia um único professor que nunca se atrasava. Era o Márcio Aristeu Monteiro de Barros, que acompanhou nossa turma em todas as disciplinas de Direito Processual Civil. Quando tocava o sinal, eu e meus colegas tínhamos o hábito de observar quantos segundos o Márcio levava para chegar à sala de aula. Eram poucos, talvez uns dez ou quinze. Podíamos vê-lo saindo da sala dos professores, com sua pastinha de couro debaixo do braço, e caminhar apressadamente até o local onde estávamos. E que ninguém ousasse interrompê-lo nesse trajeto!

Estudando a história dos cursos jurídicos brasileiros, descobri que, durante todo o período imperial, os professores observavam religiosamente o que se chamava, à época, de costume do quarto. De acordo com a norma, as aulas deveriam durar uma hora inteira. Mas elas nunca começavam antes de passados os primeiros quinze minutos, ou seja, o primeiro quarto de hora.

E o costume chegou até nós. Hoje, quando um jovem mestre se prepara para deixar a sala dos professores exatamente no horário do início da aula, é bastante provável que ele ouça alguém mais experiente exclamar: "Que furor pedagógico!". O tom, em geral, é de brincadeira. Mas é como se ele fosse advertido a preservar uma longa tradição.

Quando me tornei professor, e mudei de lado, tive uma nova compreensão do problema. A demora para chegar à sala de aula, ao contrário do que eu pensava, não decorre do atraso do professor em chegar à instituição onde trabalha. Em geral, no horário previsto para o início das aulas, estão todos lá, na sala dos professores. A demora acontece é ali mesmo. É que os professores também apreciam uma boa conversa. E, quando o ambiente é bom, a tentação de ficar mais um pouco é quase irresistível.

Mas, agora, falando sério, e com muita franqueza, não sei exatamente o que pensar do assunto.

Um pequeno atraso, inferior aos tradicionais quinze minutos, seria tolerável?

Ou vale a pena o esforço para iniciar as aulas pontualmente no horário previsto?

segunda-feira, 6 de junho de 2011

A MÁQUINA DE CORRIGIR PROVAS

Seguramente, corrigir provas é a tarefa mais terrível do magistério. Talvez, por isso, alguns professores têm o hábito de adiá-la o quanto possível.

Eu sou um deles.

Agora, por exemplo, há dois pacotes de prova em cima da minha mesa. Eles estão me olhando, sérios, aborrecidos, enquanto eu me divirto escrevendo esse texto.

E, amanhã, quando os alunos me perguntarem novamente pela prova, talvez eu utilize a resposta padrão:

- "Infelizmente, minha máquina de corrigir provas está com defeito e, dessa vez, vou ter que corrigi-las manualmente. Isso pode demorar alguns dias".

Mas, e se existisse mesmo a máquina de corrigir provas?

Quanto trabalho não seria evitado? Quanto tempo não sobraria para ler Guimarães Rosa e Caio Mário?

Mas, se existisse a tal máquina, o preço da novidade a colocaria fora do alcance de boa parte dos professores.

Sobreviveria, portanto, o método manual, demorado e aborrecido.