quarta-feira, 9 de agosto de 2017

190 anos dos cursos jurídicos brasileiros: brevíssima reflexão sobre autonomia dos estudantes

Na semana em que os cursos jurídicos brasileiros completam 190 anos, gostaria de reproduzir um pequeno trecho dos Estatutos Novos da Universidade de Coimbra que, aprovados em 1772, exerceram alguma influência na organização das academias de Olinda e São Paulo.

Trata-se da recomendação para que os estudantes, ao longo de todo o curso, ficassem obrigados a ouvir cinco horas de lições por dia, mesmo que, para isso, precisassem frequentar aulas de períodos diferentes daquele em que estavam matriculados.

O motivo, apresentado pelos Estatutos, e que pode sugerir alguma reflexão sobre os perigos da autonomia estudantil, era o seguinte:

“Porque se não houvesse esse preceito, que obrigue os ditos estudantes a ouvirem todas as cinco horas de Lições; contentar-se-iam (pela maior parte) com ouvirem somente a Lição, ou Lições, que houvesse sobre as Disciplinas próprias do ano, que cursassem; e em vez de assistirem nas Aulas por todo o tempo das Lições, e ouvirem aos Mestres, que lessem nas outras horas, para aprenderem também as doutrinas, que Eles ensinassem, sairiam delas, e iriam consumir ociosa, e inutilmente o tempo em outros exercícios, que muitas vezes lhe seriam nocivos”. 

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Dez vantagens da educação bancária


Texto gentilmente cedido pelo Professor Lemos

A “educação bancária” tem dez vantagens se comparada com a “pedagogia da autonomia”.

Em primeiro lugar, deixa claro que o professor sabe infinitamente mais que os alunos.

Em segundo lugar, deixa claro que os alunos sabem infinitamente menos que os professores.

Em terceiro lugar, demonstra que, no processo de ensino e aprendizagem, o professor somente ensina.

Em quarto lugar, demonstra que, no processo de ensino e aprendizagem, o aluno somente aprende.

Em quinto lugar, proporciona maior eficácia na transmissão das informações da cabeça do professor à cabeça dos alunos.

Em sexto lugar, permite a conferência, por meio de testes e provas, da quantidade das informações transmitidas da cabeça do professor à cabeça dos alunos

Em sétimo lugar, permite que o fracasso escolar seja creditado exclusivamente na conta do aluno que, por falta de disciplina ou inteligência, não conseguiu absorver a quantidade necessária de informações.

Em oitavo lugar, garante que os professores não sejam incomodados por perguntas difíceis.

Em nono lugar, garante que os alunos também não sejam incomodados por perguntas difíceis.

Em décimo lugar, evita que os alunos se sintam tentados a pensar por eles mesmos.

Observação: as expressões “educação bancária” e “pedagogia da autonomia” são comumente atribuídas a Paulo Freire. Nunca li nada de Paulo Freire, mas sei que as teorias dele já estão ultrapassadas. Ouvi dizer que as teorias de Paulo Freire se inspiram nas ideias de um filósofo chamado Sócrates. Até fiquei com vontade de ler os livros escritos por Sócrates, mas acabei desistindo, pois, em minha modesta opinião, Sócrates está ainda mais ultrapassado que Paulo Freire. 

terça-feira, 1 de agosto de 2017

O tablado e a educação bancária



As salas de aula da Faculdade de Direito da UFMG tinham um tablado de madeira, com uns 20 centímetros de altura, na parte da frente, perto do quadro. As dimensões da sala e o número de alunos por turma não justificavam a sua presença. Era perfeitamente possível falar e ser ouvido sem ele.

Ainda assim, os professores davam aula no tablado e, por isso, olhavam os alunos de cima pra baixo.

Não consigo pensar em símbolo mais adequado para aquilo que Paulo Freire chamou de educação bancária.

O educador pernambucano, formado em Direito, sabia muito bem como eram as aulas em que uma pessoa, dotada de grande conhecimento, depositava informações na cabeça vazia de seus alunos.

E nada melhor para justificar o método do que uma peça de mobiliário apta a criar distância entre o mestre e os discípulos, sugerindo, portanto, a hierarquia que todos deveriam respeitar. Quem conhece a matéria sobe no tablado e, do alto de sua sabedoria, lança migalhas aos ignorantes que, calados e encantados, recebem o depósito do saber alheio.

Os tablados foram retirados nas férias. Na próxima semana, com o início do semestre letivo, professores e estudantes não poderão ver a estrutura de madeira a que estavam habituados. 

Mas eu temo que muita gente sinta saudade do velho símbolo. Temo principalmente que o velho símbolo continue assombrando nosso modo de pensar e viver a educação jurídica. 

Não é difícil jogar fora uns pedaços de madeira velha e apodrecida. Difícil é aceitar, como queria o Paulo Freire, que professores e estudantes aprendem uns com os outros e ensinam uns aos outros.


Observação: a fotografia de uma sala de aula do 12º andar, feita ontem, foi gentilmente cedida pela professora Lisandra Moreira, a quem agradeço.