1. Estou disposto a continuar estudando para sempre?
Muito embora a necessidade de contínuo aperfeiçoamento também seja verdadeira em todas as outras profissões, no magistério ela assume contornos dramáticos. Todos já ouviram casos de professores que utilizam, ano após ano, as mesmas formas de abordagem, os mesmos exemplos, os mesmos casos e até as mesmas fichas velhas e amareladas. Eu mesmo tive um que passou uma aula inteira explicando lei já revogada e só se deu conta do equívoco quando advertido por um aluno.
2. Estou disposto a confessar minha própria ignorância?
Por melhor que seja a formação do professor e por mais amplo que tenha sido o seu preparo para ministrar a aula, há sempre a possibilidade de um aluno levantar uma questão para a qual ele não tem a resposta. Nessas ocasiões, tanto mais freqüentes quanto mais críticos forem os alunos, o melhor é não tentar uma solução aproximada, mas dizer francamente que não dispõe de dados suficientes para enfrentá-la.
3. Estou disposto a progredir mais lentamente que outros profissionais?
Na carreira docente não há saltos. É péssimo sinal se o jovem professor não estiver disposto a progredir mais lentamente que alguns de seus colegas que optaram por outras carreiras, como a advocacia, por exemplo. Não será igualmente feliz se ficar comparando seus rendimentos com os de um magistrado mesmo em início de carreira. Ao contrário, deve estar disposto a seguir em frente, passo a passo, semestre após semestre, na expectativa de que seus esforços e sua dedicação serão reconhecidos no futuro.
4. Estou disposto a aceitar as responsabilidades inerentes ao exercício do magistério?
Não há a menor possibilidade de um professor deixar de exercer algum tipo de influência sobre seus alunos. Se ele falta freqüentemente às aulas, se ele se apresenta para elas sem o mínimo preparo, se ele se aborrece com as perguntas dos alunos, se ele privilegia uns em detrimento de outros, se ele se omite em relação aos problemas da Escola, se ele faz tudo bem diferente do que prega, em todos esses casos, não há como evitar as repercussões naturais de seu comportamento. Em alguns alunos, provocará desânimo, em outros, revolta, em outros, apatia, em outros, indiferença. Ao contrário, se ele se esforça por dar o melhor de si, se ele se interessa sinceramente pelas dúvidas dos alunos, se o seu discurso é coerente com sua prática, em todos esses casos, haverá repercussões de outra natureza. Esperança, alento, vontade de seguir em frente.
5. Estou disposto a ser muitas vezes mal compreendido?
Tendo que atender a tantos e tão diversos interesses, o professor não deve ter a expectativa de agradar a todos. Os preguiçosos não ficarão muito felizes se ele realizar avaliações rigorosas. Os que não querem saber de nada que não possa cair num concurso público certamente acharão que ele perde muito tempo com bobagens, como, por exemplo, o estudo da história, ou a leitura desinteressada de um texto literário. Os relapsos não terão dúvida de classificá-lo como excessivamente formalista de tanto que ele insiste em observar as normas da Escola. Às vezes, explicar não vai resolver. O caso, então, é acreditar no que se está fazendo e seguir em frente.
6. Estou disposto a não conhecer os mais importantes resultados de meu trabalho?
Grande parte do que faz o professor não vem à luz imediatamente. Se a sentença de um juiz é confirmada no Tribunal, se o voto de um ministro é acolhido pelos colegas, se a tese de um advogado prevalece num julgamento, em todos esses casos, o resultado é logo perceptível. Mas, como verificar as conseqüências de um conselho dado em sala de aula, de uma sugestão oferecida a um orientando, de um texto escrito e publicado? A porção mais significativa dos resultados de suas ações, justamente porque diz respeito a aspectos muito profundos da existência humana, não será conhecida pelo professor.
7. Estou disposto a contrariar muitos interesses?
Se o professor quiser se manter fiel aos seus princípios, deve estar preparado para enfrentar corajosamente tanto alunos que não têm compromisso com o aprendizado quanto instâncias da administração escolar que não estejam cumprindo adequadamente as normas acadêmicas.
8. Estou disposto a me acostumar com a solidão?
Somente uma pequena parte do trabalho do professor acontece sob os olhos do público. Mesmo nesses momentos, em sala de aula ou numa conferência, por exemplo, lá está o professor sozinho, isolado em seu posto e em sua função, vigiado atentamente por uma pequena multidão de observadores. A maior parte do tempo, no entanto, ele passa realmente sozinho, estudando, lendo, tomando notas, preparando aulas, elaborando provas, corrigindo provas, colocando em dia sua correspondência eletrônica, preenchendo relatórios, etc.
9. Estou disposto a trabalhar em equipe?
Muito embora deva saber trabalhar sozinho, o professor não será completo se tiver dificuldade de trabalhar em equipe. Nessas ocasiões, deve estar pronto para ouvir as opiniões dos colegas, assumir a perspectiva do outro, transigir quando possível, insistir num ponto quando for importante. Também não deve se omitir de participar da administração escolar, quando solicitado, bem como jamais imaginar que poderá construir sua carreira sem se interessar pelo destino da instituição em que está inserido.
Resultado.
Muito bem. Responder positivamente a essas questões pode ser um bom sinal para quem deseja se aventurar na carreira docente. Não ficar à vontade em relação a algumas, no entanto, pode não significar o fim da linha. Nesse caso, com algum esforço, com tempo e com paciência, podem surgir novas formas de ver o mundo, e novas habilidades podem ser desenvolvidas.
*Essas questões foram apresentadas aos participantes do Ciclo de Iniciação Jurídica, realizado na Faculdade de Direito da UFMG, em 18 de março de 2009.
12 comentários:
Legal, Giordano.
Parabéns pela iniciativa.
Conte comigo, se eu puder ajudar.
De onde saiu esse nome romano? Seguramente não fui eu que me dei...
Agora acho que criei um nome corretamente.
Giordano,
Seu exemplo é inspirador!
Estava faltando mesmo uma voz reflexiva sobre esta nossa profissao de fé. Em tempos onde nem sempre o que se escreve é feito, nde a ética é contingenciada ao gosto do freguês sua iniciativa nao poderia ser mais oportuna.
Compartilho com você as sempre valiosas liçoes de Paulo Freire (Pedagogia da autonomia) "Ensinar exige segurança, competência profissional e generosidade", vide este resuminho:
http://www.youtube.com/watch?v=YzURD6CgVs4&eurl=http%3A%2F%2Fhistoriaemprojetos%2Eblogspot%2Ecom%2F2008%2F08%2Fpaulo%2Dfreire%2Dpedagogia%2Dda%2Dautonomia%2Ehtml&feature=player_embedded
PARABéNS!!! Abs
César,
Muito obrigado. É uma honra receber sua visita. Grande abraço,
Giordano.
Fabiana,
Obrigado pelo incentivo. Estamos juntos nessa tarefa, não é mesmo?
Um abraço,
Giordano.
Oi Giordano,
Adorei!
Parabéns pela oportuna iniciativa e pelo interessante e inovador espaço de reflexão de nosso "fazer".
Já inclui nos meus favoritos para voltar mais vezes.
Grande abraço,
Adriana Sena
Adriana,
É um prazer receber a sua visita. Volte sempre.
Um abraço,
Giordano.
Parabéns, professor, só faltou falar sobre as partes boas e gratificantes da profissão.
Eu sei que o objetivo do texto não é dizer tudo que se tem a dizer sobre o magistério, mas com isso quero dizer que gostarei de ver-te falando apaixonado sobre o quão gratificante pode ser a sua profissão.
Abraço,
Mateus Araújo
Mateus,
Obrigado pela sugestão. Vou pensar a respeito.
Um abraço,
Giordano.
Primeiro acesso ao blog e o achei muito bom, frente ao primeiro post. Quero ser professor. Gostei das perguntas e das minhas respostas. =)
Elton,
Que bom que você gostou! Muito sucesso em suas escolhas profissionais!
Giordano.
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