"Na véspera de não partir nunca,
Ao menos não há que arrumar malas".
De fato, quem pretende ficar em casa não precisar realizar preparativos. Mas quem deseja por o pé na estrada não pode deixar de pensar no assunto.
Exercer uma profissão é como fazer uma viagem. Não é a toa que a realização continuada de qualquer tipo de trabalho é denominada carreira. Sim, carreira, jornada, caminhada, viagem.
O magistério é uma viagem.
Como se preparar para empreendê-la?
Que itens colocar na bagagem?
É evidente que o tipo de preparo prévio depende do tempo de que se dispõe para fazê-lo. Muitas vezes, os instrumentos de que o professor necessita para bem desempenhar suas funções são adquiridos ao longo de sua jornada.
Havendo possibilidade, no entanto, eu sugeriria que o interessado cuidasse de colocar na mala os seguintes itens:
1. Caráter
Paulo Freire, em Pedagogia da Autonomia, afirma que:
“Quem pensa certo está cansado de saber que as palavras a que falta a corporeidade do exemplo pouco ou quase nada valem”.
O que se candidata ao magistério deve cuidar de explorar suas próprias fragilidades, identificando os pontos que devem ser trabalhados, para, em seguida, empregar todos os recursos a que puder ter acesso a fim corrigi-los e avançar rumo a novos desafios.
Do contrário, ficará obrigado a ver suas palavras desmentidas, diariamente, pelo modo como se comporta.
Dizer que caráter é item que deve ser colocado na bagagem é acreditar que o homem pode experimentar mudanças interiores, pequenas ou grandes. E eu acredito nisso.
2. Paixão
Rubem Alves, em Conversas com Quem Gosta de Ensinar, propõe a seguinte reflexão:
“Se nem nós estávamos em nosso discurso, como poderíamos pretender que aqueles que a escola nos entregou como alunos estivessem?”
Se o professor não acredita no que pensa, no que diz, ou no que faz, nunca poderá provocar reações positivas em seus alunos.
O magistério não é daquelas profissões a que os praticantes podem se entregar mecanicamente, esperando o término do expediente para buscar realização e felicidade.
O professor, muito embora afligido por angústias e dificuldades, deve ser feliz enquanto realiza o seu ofício.
Se a paixão pelo ensino não estiver na bagagem, o trajeto promete muito sofrimento, tanto para o viajante quanto para aqueles que tiverem o azar de se encontrar com ele.
3. Conhecimento
Rui Barbosa, na sua Oração aos Moços, confessou:
“Estudante sou. Nada mais. Mau sabedor, fraco jurista, mesquinho advogado, pouco mais sei do que saber estudar, saber como se estuda, e saber que tenho estudado”.
Para o bom exercício de suas tarefas, o professor deverá utilizar conhecimentos amplos e variados.
E bem fará o candidato ao magistério jurídico se trouxer, dos bancos acadêmicos, bons elementos de Filosofia e de História; do Direito, em geral, e especialmente do ramo a que pretende se dedicar; de línguas estrangeiras, principalmente das que forem mais úteis ao objeto de suas futuras pesquisas; de Didática e de Metodologia do Ensino Superior; e, por fim, de tudo que for útil para que tenha vernaculidade.
A lista, embora ampla, não deve servir para desanimar os candidatos.
Quanto a mim, preciso dizer que comecei a viagem sem estar minimamente preparado em alguns desses itens, e ainda hoje me sinto bastante inseguro em muitos deles.
É o caso de colocar na mala, antes do embarque, exatamente tudo o que for possível, mas não deixar de acrescentar outros objetos enquanto a viagem acontece.
4. Experiência
Experiência no magistério só se poderá obter no exercício do magistério. Nada mais evidente.
Mas há certas atividades que poderiam ser muito proveitosas aos candidatos à docência, especialmente três: monitoria, iniciação científica, participação no movimento estudantil.
Com a primeira, pelo convívio diário com o orientador, o interessado poderia perceber o modo como são realizadas as mais diversas tarefas ligadas ao magistério, desde a preparação de aulas, até o preenchimento de relatórios. Com a segunda, experimentaria a pesquisa, atividade a que o futuro professor deverá necessariamente se dedicar. Com a terceira, obteria elementos que o poderiam ajudar no exercício de funções administrativas.
Desse modo, envolvendo-se com tais atividades e outras semelhantes, o estudante que se sente chamado para o magistério poderá começar a obter aquilo de que fala o Camões: “um saber só de experiências feito”.
CONCLUSÃO
Esses são apenas alguns elementos que os interessados deveriam colocar na bagagem. Trazê-los consigo pode tornar o percurso um pouco mais suave. Mas não evita os imprevistos, nem impede os acidentes. Afinal, como disse o Rosa:
“O real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia”.
*Essas questões foram apresentadas aos participantes do I Congresso da CORED-MG, realizado na Faculdade de Direito da UFMG, em 24 de outubro de 2009.
4 comentários:
Muito bonito o texto, Giordano.
Oi, Gabriel, tudo bem?
É uma honra tê-lo como leitor do blog. Quando quiser, envie sua colaboração.
Até,
Giordano.
Professor,
Sua palestra foi excelente! Meus parabéns e muito obrigado!
Lucas,
Eu é que agradeço pela oportunidade de falar sobre um tema que me é tão caro. Foi um prazer.
Até,
Giordano.
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