Em 1870, Rui Barbosa concluiu o bacharelado na Faculdade de Direito de São Paulo. Cinqüenta anos depois, ouviu-se, na mesma Escola, a leitura de um discurso de paraninfo, por ele composto, publicado, posteriormente, sob o título de Oração aos Moços. Trata-se de singular peça de oratória, tida, por João Baptista Villela, como um dos dez mais belos textos escritos em língua portuguesa. Dele, escolhi transcrever um pequeno trecho, apto a sugerir, a estudantes e estudiosos, do Direito e de outras Ciências, o caminho para se obter verdadeiro sucesso nos estudos.
"Estudante sou. Nada mais. Mau sabedor, fraco jurista, mesquinho advogado, pouco mais sei do que saber estudar, saber como se estuda, e saber que tenho estudado. Nem isso mesmo sei se saberei bem. Mas, do que tenho logrado saber, o melhor devo às manhãs e madrugadas. Muitas lendas se têm inventado, por aí, sobre excessos da minha vida laboriosa. Deram, nos meus progressos intelectuais, larga parte ao uso em abuso do café e ao estímulo habitual dos pés mergulhados n'água fria. Contos de imaginadores. Refratário sou ao café. Nunca recorri a ele como a estimulante cerebral. Nem uma só vez na minha vida busquei num pedilúvio o espantalho do sono.
Ao que devo, sim, o mais dos frutos do meu trabalho, a relativa exuberância de sua fertilidade, a parte produtiva e durável da sua safra, é às minhas madrugadas. Menino ainda, assim que entrei ao colégio, alvidrei eu mesmo a conveniência desse costume, a daí avante o observei, sem cessar, toda a vida. Eduquei nele o meu cérebro, a ponto de espertar exatamente à hora, que comigo mesmo assentava, ao dormir. Sucedia, muito amiúde, encetar eu a minha solitária banca de estudo à uma ou às duas da antemanhã. Muitas vezes me mandava meu pai volver ao leito; e eu fazia apenas que lhe obedecia, tornando, logo após, àquelas amadas lucubrações, as de que me lembro com saudade mais deleitosa e entranhável.
Tenho, ainda hoje, convicção de que nessa observância persistente está o segredo feliz, não só das minhas primeiras vitórias no trabalho, mas de quantas vantagens alcancei jamais levar aos meus concorrentes, em todo o andar dos anos, até à velhice. Muito há que já não subtraio tanto às horas da cama, para acrescentar às do estudo. Mas o sistema ainda perdura, bem que largamente cerceado nas antigas imoderações. Até agora, nunca o sol deu comigo deitado e, ainda hoje, um dos meus raros e modestos desvanecimentos é o de ser grande madrugador, madrugador impenitente".
(BARBOSA, Rui. Oração aos Moços. Rio de Janeiro: Ediouro, p. 61-63).
3 comentários:
E aí Giordano, tudo bem? Descobri o seu blog hoje e já o coloquei entre os meus favoritos. Não fosse pelo aprendizado que tive com você na Vetusta, seria pelo prazer que tenho em estudar questões sobre ensino jurídico. Nesse pouco tempo de magistério, me apaixono a cada dia com o processo de aprendizagem.
Grande abraço,
Raphael Maia
Grande Raphael,
É uma grande alegria receber notícias suas. Fico especialmente feliz em saber que você está feliz no magistério. Sim, porque eu achava que o seu negócio era mesmo a música. Um grande abraço e até a vista.
Giordano.
Um bom conteúdo é escrito em 2009 e continua relevante e tendo visitas em 2020. Ótimo post! Me passa seu instagram se possível Giordano, caso tenha.
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