quinta-feira, 14 de junho de 2018

A mosca azul da pesquisa

Quando ingressei no curso jurídico, tinha a vaga impressão de que seria advogado. Naquele momento, todas as outras possibilidades me pareciam muito distantes. Foi no terceiro período que surgiu um elemento novo. 

Curioso com a publicação de um edital de pesquisa, fui atrás de informações adicionais. Descobri que a candidatura dependia da elaboração de um projeto e da anuência de um orientador. Com o tema na cabeça, tentei contato com a professora da minha matéria favorita, mas não tive sucesso. Como segunda opção, procurei o professor de uma disciplina em que meu aproveitamento fora apenas razoável. E a conversa não poderia ter sido melhor, pois ele não somente aceitou o convite como também sugeriu que o resultado deveria ser publicado. Lembro-me claramente de suas palavras: “Não podemos escrever e depois deixar na gaveta”. 

A proposta foi aprovada, a pesquisa foi feita e o relatório final, de fato, foi publicado. Ao longo da realização do trabalho, meu entusiasmo era tão grande que o orientador disse algo mais ou menos assim: “Lamento informar, mas você foi picado pela mosca azul da pesquisa”. 

Eu não compreendia o alcance da frase, mas ele sabia exatamente o que estava dizendo.

A antiga lenda oriental, retomada por Machado de Assis no poema A Mosca Azul, conta a história de um homem muito simples, que ficou encantado com a beleza do pequeno inseto e, depois de aprisioná-lo, começou o minucioso trabalho de dissecação. Mas a mosca, coitada, não resistiu e acabou morrendo, “e com isto esvaiu-se-lhe aquela visão fantástica e sutil”. Por esse motivo, “dizem que ensandeceu e que não sabe como perdeu a sua mosca azul”.

No meu caso, o contato com a pesquisa, proporcionado pela experiência da iniciação científica, foi decisivo para a descoberta da vocação acadêmica. E uma vez conhecida, eu não fiz mais do que correr atrás de sua realização. 

Além da atividade de pesquisa, a monitoria também pode funcionar como teste vocacional. Trata-se da forma mais adequada de conhecer o cotidiano do magistério, com todos os seus desafios e alegrias. 

Ao longo do meu processo formativo, tive apenas um orientador, na monitoria, na iniciação científica, na monografia de final de curso, no mestrado e no doutorado. Foi o professor César Fiuza, uma das pessoas mais generosas que conheço. Devo muito a ele, inclusive a historinha da mosca azul.

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