sábado, 4 de julho de 2009

ALUNO: ALÉM DE ETIMOLOGIA, LUZES E ALIMENTOS

Contribuição enviada por João Vítor Rodrigues Loureiro,
aluno, ou melhor, estudante do 9º período
da Faculdade de Direito da UFMG


Desde os meus quinze anos me incomodo com a palavra “aluno”. Desde então, me faz coçar as pestanas, me bate um sentimento de estar encurralado por livros empoeirados e um homenzinho arrogante à minha frente, de unhas carcomidas e óculos na ponta do nariz, a apontar seu dedo envelhecido a fórmulas mirabolantes e frases avulsas, com uma expressão obscura e inquisidora.

Deve ter sido culpa de meu professor de Português da oitava série. Ele parece ter puxado minha cadeira de quatro pés, ao anunciar numa aula que não éramos alunos. ALUNO, aquela palavrinha tão insignificante que nunca havia me incomodado, que era parte do meu dia a dia, eu aluno, ele, professor. Professor professava qualquer coisa, era uma espécie de profissão de gente que acreditava, se não fosse no futuro daquelas cabeças avoadas de quatorze, quinze anos, acreditava pelo menos que algum dia receberia um aumento salarial.

Mas aluno...O que fazia o aluno? “Alunava”, avoava, lá pela Lua, talvez.

Aí veio a lição etimológica: “aluno vem do latim, meus caros, de a - (partícula de negação, ausência) e lumnus (luz)”. Caí em mim: eu era um reles aluno, criaturinha perdida na sala escura, sem qualquer luz. A luz estaria com o professor velho do dedo carcomido e sua peruca de filósofo iluminista. Não! (não que o professor que me esclareceu o conceito tivesse medonhos traços).

Acreditei nisso até hoje. Alguns vieram tentar me esclarecer (mais uma palavra que indica essa relação entre luz e trevas no jogo do conhecimento) que “aluno” na verdade teria origem em “alere” (nutrir, alimentar, amamentar) numa relação quase maternal entre discente e docente, e teria sido consagrado antes de lições escolásticas e modelos medievais de ensino universitário. Não sei, não encontrei fontes seguras de que a etimologia que havia aprendido estava errada.

Palavras escondem contextos culturais; como um conceito pode chegar vivo até os dias de hoje?

Independente de etimologia, espero não deparar com seres iluminados. Eles ofuscam a vista dos estudantes com sua vaidade, sem chamar atenção ao que importa. Conhecimento.

5 comentários:

Giordano Bruno Soares Roberto disse...

João Vítor,

Obrigado pela colaboração.

Você acha que deveríamos simplesmente suprimir o uso da palavra "aluno", renunciado a uma tradição multissecular? Não seria melhor reconhecer que, ao pronuciá-la em novo contexto, estaríamos evocando outro significado?

Um abraço,

Giordano.

Joao Vitor disse...

Giordano,

Suprimir nao é a melhor sugestao. Mas toda palavra que usamos carrega um sentido próprio, e que inevitavelmente preserva uma tradicao (ela é passada de uma geracao a outra por meio do uso, sendo reformulado seu significado ou nao.)Vale dizer, estar diante de palavras é estar diante de uma amostra do passado, restaurado no tempo presente.

Assim, alguns hábitos e práticas permanentes das sociedades humanas sao demonstrados por meio dos significantes e significados linguísticos. Uma outra boa parcela de vocábulos vive em constante alteracao, por requerem sentidos diferentes, exigidos para a compreensao do nosso tempo. (assim, "casa" hoje nao mais significa o que "casa" significava no século IV a. C., tampouco "família", tampouco "sexo", tampouco "dinheiro", tampouco "política", e por aí vai).

Ainda assim, é de se justificar o estudo etimológico das palavras, para entendermos o porquê de seu uso em tempos presentes.

Todo modo, espero que o sentido de "aluno", na vida prática, nunca seja o de recuperar uma relacao vertical e desigual no processo de ensino em tempos remotos. Nao é mesmo?

Anônimo disse...

O termo que uso é ESTUDANTE, simplesmente quem estuda, ganha mais força em cientista, quem busca conhecimento.
Assim, eu, professor e meu "aluno" estaríamos em patamar de seres que buscam...
considerando que eu não sou o único que ensina, a educação é um ato de troca de conhecimentos.

ALUNO, pra mim é achincalhamento, ganhou conotações pejorativas no popular.
O Aurélio define apenas como "pessoa que recebe lições de um mestre" e sabemos que um ser assim é muito passivo, longe do perfil que queremos hoje.
E sabemos que não somos unicamente mestres.

leandro (tomara que consiga postar)
leandro-fire@hotmail.com

Giordano Bruno Soares Roberto disse...

Leandro,

Obrigado por sua colaboração.

Devo dizer que não tenho nenhuma birra com a palavra "aluno". Não me sinto inferior quando falo que fui "aluno" desse ou daquele professor e não me sinto superior quando falo que fulano é ou já foi meu "aluno".

Penso que a escolha decisiva para nós, professores, é a do tipo de prática pedagógica que iremos empregar e não da palavra que utilizaremos para designar os que compartilham a estrada conosco.

Um abraço,

Giordano.

Adriane Schroeder disse...

Que tal estudar o verbo "Alere" - alimentar, aleitar antes de ir pela primeira etimologia de beirea de esquina?