segunda-feira, 14 de maio de 2018

O cão vivo e o leão morto

Uma das cenas mais geniais de Chaplin está no filme O Circo. Ao fugir de um jumento que não lhe era simpático, o vagabundo acaba entrando na jaula do leão que, por sorte, curtia a soneca da tarde. Sua primeira reação é de pânico, principalmente ao perceber que não conseguia abrir a porta. Mas tudo muda quando o bicho abre os olhos, cheira o invasor e, depois, volta a se deitar preguiçosamente. Carlitos, percebendo que era observado pela filha do dono do circo, por quem nutria grande admiração, começa a exibir um comportamento corajoso. Certo de que o leão era inofensivo e não estava faminto, mantém a pose de serenidade e não abandona o local nem mesmo quando a porta é aberta. No entanto, basta o felino abrir a boca para que ele saia correndo em completo desespero. 

Entre outras coisas, a cena mostra que um leão é sempre um leão. Pode ser domesticado, pode parecer sonolento, pode estar bem alimentado, mas ainda é um leão. E um leão deve ser temido, em qualquer lugar, em todo o tempo, a menos que esteja morto.

É mais ou menos esse o assunto de um antigo provérbio judaico:

Para os vivos ainda há esperança, pois mais vale um cão vivo que um leão morto.

Um leão é uma grande fera, mas só enquanto está vivo. Um cão pode não ser lá muita coisa, mas, enquanto vive, é alguma coisa.

Você pode até reclamar do estilo da comparação, que é um tanto rude, mas não deveria perder a oportunidade de celebrar a esperança.

Talvez não haja mais tempo para escrever um tratado sobre a natureza humana, mas dá para escrever uma carta de amor.

Talvez não haja mais tempo para levantar um império empresarial, mas dá para construir uma casa na praia.

Talvez não haja mais tempo para fazer doutorado em teologia, mas dá para ler pausadamente o livro de Salmos.

Os erros cometidos até o dia de hoje limitam, mas não bloqueiam o dia de amanhã. As possibilidades podem diminuir com o passar do tempo, mas não até o ponto da completa extinção.

Por isso, quem deseja aprender sobre planejamento deve ter sempre presente que, enquanto há vida, há esperança. Ou, para usar a figura bíblica, deve saber que mais vale um cão vivo que um leão morto.

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