terça-feira, 9 de junho de 2009

DO TEMPO EM QUE AINDA HAVIA GAZETEIROS

Entre 1829 e 1861, Prudêncio da Veiga Cabral foi professor de Direito Civil na Academia Jurídica de São Paulo.

Uma de suas características mais destacadas era a de não ser muito freqüente.

Para saber um pouco mais sobre o excêntrico personagem, basta seguir, nas próximas linhas, o relato de Almeida Nogueira.

Não imagino que tipo de sentimentos o texto provocará no nobre leitor.

Em mim, confesso, causou-me profundo conforto ao me fazer recordar que já não há mais gazeteiros como o Cabral.


“Era muito pouco assíduo à Academia. Entretanto, nos dias tempestuosos, comparecia – infalivelmente.

E então, jactava-se de ser cumpridor dos seus deveres, tanto que, vencendo as intempéries, ali se achava. Onde estavam os outros lentes? Onde o Brotero que tanto se implicava com suas faltas? Vadios!...

Ao contrário, quando fazia bom tempo, era muito problemática a sua vinda à Academia. Preferia dar um passeio, às vezes rural.

Algumas vezes vinha-se encaminhando para a Academia e, ao enfrentar o cruzeiro de pedra, diante das arcadas exteriores, deparando-se avultado número de discípulos seus que o esperavam, dobrava a esquina da Rua do Ouvidor e...ia-se embora, a passeio, a rir-se com seus botões pelo logro que havia pregado aos estudantes.

Numa feita, encontrou ele num desses passeios um dos seus discípulos. No dia seguinte perguntou ao bedel Mendonça se tinha marcado ponto naquele estudante.

– Não, senhor, sr. conselheiro...

O estudante, que ouvira a pergunta, observa em tom muito respeitoso:

– Mas, sr. conselheiro, pois se não houve aula...

– Mas o sr. não sabia que eu não viria. A sua obrigação era estar aqui, e o sr. não veio à Academia. Sr. Mendonça, marque ponto neste moço!

– Mas, sr. conselheiro...

– Se não está contente, leva uma falta injustificável. Olhe lá!”


(NOGUEIRA, José Luís de Almeida. A Academia de São Paulo: Tradições e Reminiscências. Volume II. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1977, p. 247).

2 comentários:

Unknown disse...

Que é isso, professor!

Não seja tão otimista... Atualmente, muitos há como o Cabral. E, se não saem à passeio rindo com seus botões, é porque transformaram seu logro em atividade mais rentável.

De todo modo, parabéns pelo blog! Nesse caso, compartilho seu otimismo.

Abraço!

Jeferson Mariano Silva.

Giordano Bruno Soares Roberto disse...

Jeferson,

Que bom receber a sua visita e perceber que você continua o mesmo.

Até,

Giordano.