Meu pai é um típico torcedor atleticano. Nunca desiste de nada. Não se importa com sofrimento. E tem uma explicação pra qualquer tipo de fracasso. Se o Galo perde um jogo, diz que foi bom para o treinador sacar o lateral que não joga nada. Se perde o campeonato, diz que foi necessário para a diretoria demitir o treinador que não tem visão de jogo. Se desperdiça uma temporada inteira, diz que foi importante para eleger uma diretoria mais comprometida.
Não deve ter sido fácil quando ele percebeu que o filho preferia o Flamengo, o grande adversário daqueles gloriosos anos 80. Eu tento me explicar com a indicação de três motivos. Em primeiro lugar, digo que a culpa é da Rede Globo que, pra aquelas bandas de Minas, só transmitia o Campeonato Carioca. A segunda causa é a influência de uma pessoa muito querida, o Doutor Araújo, médico da família, que, nas inúmeras vezes em que me atendia, com a voz um tanto nasalada, começava sempre com a mesma frase: “E o nosso Flamengo?”. Mas o motivo principal foi ter visto o Zico jogar. Acho que eu não torcia para o Flamengo. Torcia para o Zico. Tanto que até hoje tenho dificuldade de utilizar a palavra craque para me referir a outros atletas.
Nunca fui muito original. Quando criança, assim como a maioria dos meus amigos, queria ser jogador de futebol. Depois dos jogos, tinha dificuldades para dormir. Ficava horas e horas rememorando os lances. Lamentando os passes errados. E saboreando novamente os dribles e as assistências. Sonhava com o dia em que entraria na Gávea e seria recebido pelo Zico. Imaginava a estreia com o Maracanã lotado. E planejava repetidas vezes o que diria na primeira entrevista. Era sempre algo mais ou menos assim: “Quero agradecer a todos os que me incentivaram e principalmente ao meu pai e ao meu tio Geraldo, que foram meus primeiros treinadores”.
A verdade é que tudo não passou de um sonho de criança. Nunca cheguei a fazer teste em um time de verdade. Acho que o meu caso era mais esforço e insistência do que talento. E pra ser franco, também acredito que não teria sido feliz se tivesse seguido carreira no futebol.
Contei essa história só pra dizer que a primeira pista para pensar em vocação pode ser dar uma olhada nos sonhos de infância. O que você queria ser quando era criança? Com o que sonhava? Para onde seus pensamentos retornavam com freqüência? Tudo bem que no meu caso a estratégia parece não ter dado certo. Não fui jogador de futebol. Já não tenho idade para isso. E nem mesmo sei se gostaria de ter escolhido o esporte como profissão. Mas não é bem assim. Além de jogar no Flamengo, eu também tinha o sonho de escrever livros, de ver meu nome impresso nas capas, de conversar com as pessoas sobre os textos publicados. Nesse caso, o sonho ainda está vivo. E isso pode ser uma pista para me ajudar a repensar o que tenho feito até aqui. E decidir como devo continuar.
Talvez você possa fazer algo parecido. Separe um tempo para pensar em seus sonhos de infância. Converse sobre isso com os pais, os tios e os velhos amigos. Será que ainda resta alguma coisa aí dentro? Será que uma daquelas ideias antigas ainda faz sentido?
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